CAMPOS,
Siqueira
*militar; rev. 1922; rev. 1924; Col. Prestes
Antônio de Siqueira Campos
nasceu em Rio Claro (SP) no dia 18 de maio de 1898, filho de Raimundo Pessoa de
Siqueira Campos e de Luísa Freitas de Siqueira Campos. Seu bisavô, um português
da família Campos, emigrou para o Brasil e foi trabalhar como agricultor em
Pajeú das Flores, no interior do estado de Pernambuco, onde se casou com uma
moça da família Siqueira, grande proprietária de terras da região. Seu avô
paterno, Pedro Pessoa de Siqueira Campos, lutou na Guerra do Paraguai, a
princípio como soldado raso e depois como coronel honorário, tendo sido
condecorado por dom Pedro II por atos de bravura.
Siqueira
Campos passou a infância em Rio Claro e depois em São Manuel do Paraíso,
lugares onde seu pai, homem de poucas posses, administrou fazendas de café de
propriedade do irmão. Esse irmão, Manuel de Siqueira Campos, além de rico
proprietário de fazendas de quatrocentos mil pés de café, foi também presidente
da Câmara de Rio Claro e chefe de polícia de São Paulo no governo de Américo
Brasiliense. O pai de Siqueira Campos nunca permitiu que seus filhos se
iludissem com as aparências e considerassem como deles a fortuna do tio. Em
1904, mudou-se para a cidade de São Paulo acompanhado da família e foi ocupar o
cargo de almoxarife do Departamento de Águas, com “o excelente salário de
setecentos mil-réis”.
Na
capital paulista Siqueira Campos fez o curso primário no Grupo Escolar Sul da
Sé de 1904 a 1907 e o secundário no Ginásio do Estado de São Paulo, formando-se
em 1914 com “grande distinção”. Pretendia continuar os estudos, mas a situação
da família mudou. Depois da morte de sua mãe, vítima de um acidente, seu pai
resolveu casar-se novamente. Siqueira Campos tinha na época 16 anos e sua
madrasta era mais moça do que ele. Na pressa de construir um novo lar, seu pai
mergulhou a família em dificuldades financeiras. Siqueira Campos viu frustrados
seus planos de cursar engenharia na Escola Politécnica do Rio de Janeiro, então
Distrito Federal, ao mesmo tempo, em que se deterioravam suas relações com o
pai. Os irmãos mais velhos, Raimundo e Ananias, saíram de casa. Pouco tempo
depois, em 1915, Siqueira Campos seguiu o exemplo dos irmãos e mudou-se para o
Rio.
Como
as portas da Escola Politécnica estivessem fechadas para ele, Siqueira Campos —
assim como vários filhos de famílias pobres que desejavam prosseguir os estudos
— escolheu a carreira militar. Em 13 de abril de 1916, sentou praça como
voluntário por dois anos e foi incluído na 4ª Companhia de Infantaria da Escola
Militar do Realengo, no Rio. No mês seguinte foi incluído no quadro efetivo de
alunos da escola, indo para a 3ª Companhia de Infantaria. Suas preferências,
entre as matérias do currículo, dividiram-se entre balística e a matemática, o
que o levaria mais tarde à escolha da arma de artilharia. O ensino dentro da
escola primava pelo “respeito à ordem constituída”. Embora fosse “quase
proibido pensar”, a disciplina não impedia que Siqueira Campos e seus colegas
discutissem exaustivamente os problemas brasileiros. Já nessa época ele usava
freqüentemente a expressão “Brasil novo” para definir sua esperança de uma
mudança no regime político e social que caracterizava a República Velha.
Dois
amigos se destacaram do círculo de colegas de Siqueira Campos. Eduardo Gomes,
fechado e religioso — conhecido como “frei Eduardo” —, e Estênio Caio de
Albuquerque Lima foram os companheiros com quem alugou uma casa em Realengo a
fim de estudarem de madrugada. A casa recebeu o nome de “Tugúrio da morte” e
passou a abrigar um grupo estudioso e esfomeado. Esta última característica foi
responsável pelo desaparecimento de várias galinhas dos galinheiros da
redondeza. Nessa turma privilegiada, de onde sairiam os líderes de
acontecimentos que iriam mudar a face da República, Siqueira Campos era amigo
de todos, mas admirava especialmente Luís Carlos Prestes.
A
guerra na Europa dava assunto para várias discussões entre os cadetes: além das
posições opostas sobre o pangermanismo e a Revolução Russa de 1917, o tema que
inflamava os ânimos era o da entrada do Brasil na Primeira Guerra Mundial.
Maurício de Lacerda, então deputado federal, não se cansava de pedir a entrada
do Brasil na guerra: apresentou um projeto que foi derrotado em terceira
discussão da Câmara, e, durante sua pregação, chegou a procurar os alunos da
Escola Militar do Realengo. Siqueira Campos, um dos mais entusiasmados, fez
parte da guarda-de-honra na homenagem prestada no Teatro Municipal do Rio de
Janeiro ao poeta Olavo Bilac, outro defensor da participação no conflito.
No
Brasil, o período 1917-1920 foi marcado também por agitações sociais. Os
operários da fábrica Bangu entraram em greve reivindicando melhores salários e
condições de trabalho. No encontro do choque de polícia enviado pelo governo
com os grevistas alguns operários foram mortos. O governo recuou, retirou a
polícia e em seu lugar enviou os cadetes da Escola Militar, que foram bem
recebidos pelos trabalhadores. Entre os cadetes que patrulharam a via férrea
entre Bangu e Realengo estava Siqueira Campos. Mais tarde, comentando esse
incidente, Siqueira Campos dizia que os cadetes, que se julgavam politizados
naquela época, não tinham a menor consciência dos problemas sociais.
Um único incidente marcou a vida escolar de Siqueira Campos:
em 1918, ainda cadete, agrediu a chicote na rua um delegado de polícia que o
destratara. No julgamento, seus bons antecedentes e sua aplicação nos estudos
pesaram a seu favor, mas, mesmo assim, foi condenado a 15 dias de prisão no
forte de Santa Cruz por “desacato a autoridade civil”.
A
turma de Siqueira Campos, da qual faziam parte, além dos já citados, Frederico
Cristiano Buys, Ciro do Espírito Santo Cardoso, Paulo Kruger da Cunha e Cruz,
Honorato Pradel, José Bina Machado e Carlos da Costa Leite, entre outros,
terminou o curso da Escola Militar em 1918. Nesse mesmo ano Siqueira Campos
matriculou-se no Curso Especial de Artilharia, sendo declarado artilheiro em 30
de dezembro de 1919. Promovido a segundo-tenente em 2 de janeiro de 1920, foi
classificado na 1ª Bateria de Costa, sediada no forte de Copacabana, onde se
apresentou no dia 19 do mesmo mês.
Inaugurado
em setembro de 1914, o forte de Copacabana fazia parte de um conjunto de seis
fortes responsáveis pela defesa do Rio, e era comandado pelo capitão Euclides
Hermes da Fonseca, filho do ex-presidente da República, marechal Hermes da
Fonseca. No início de 1921, nomeado juiz da Auditoria de Guerra da 1ª Região
Militar (1ª RM), Siqueira Campos deixou o forte, retomando pouco depois para
assumir os cargos de ajudante-secretário da unidade e de comandante das torres
de 190mm. Por essa época, suas leituras preferidas eram o filósofo argentino
José Ingenieros — principalmente no livro A luta pela vida — Pio
Baroja, Blasco Ibañez, Emil Ludwig, Machado de Assis e, ainda, livros sobre a
história do Brasil colonial.
Apesar
de ser considerado um oficial inflexível com a disciplina, Siqueira Campos
gozava de grande prestígio no meio da tropa por seu senso de justiça e sua preocupação
com as condições de vida dos soldados. Amigo do comandante Euclides Hermes da
Fonseca, tornou-se seu auxiliar direto e, em janeiro de 1922, durante as férias
deste, respondeu interinamente pelo comando do forte. Além do trabalho e do
estudo, Siqueira Campos dedicava-se também ao esporte. Seus subordinados contam
que, para relaxar o corpo após um dia de trabalho, costumava convidá-los a
atravessar a nado do forte de Copacabana à ponta do Leme.
Seguindo o exemplo de Eduardo Gomes, em fevereiro de 1922
Siqueira Campos conseguiu autorização para submeter-se aos exames para a Escola
de Aviação Militar. Entretanto, julgado incapaz no exame de vista, voltou ao
forte de Copacabana, reassumindo suas funções de ajudante-secretário e, no mês
seguinte, o comando da cúpula de 190mm.
A Revolta de 1922
Desde
1921, Artur Bernardes, presidente do estado de Minas Gerais, era o candidato
oficial à sucessão de Epitácio Pessoa na presidência da República, o que,
segundo a tradição, constituía uma garantia de vitória. No entanto, a
candidatura concorrente de Nilo Peçanha, na legenda da Reação Republicana,
granjeou também um apoio considerável. As desavenças entre as duas correntes
políticas penetraram no seio do Exército através de uma série de incidentes,
entre os quais se destacou a publicação, em outubro de 1921, pelo Correio da
Manhã, das chamadas “cartas falsas”, atribuídas a Bernardes e cujo teor
provocou escândalo nas forças armadas: nelas o marechal Hermes era chamado de
“sargentão” e um banquete do Clube Militar era qualificado de “orgia”.
Apesar
da oposição militar, Bernardes foi eleito em 1º de março de 1922, derrotando
Nilo Peçanha. A essa altura, oficiais do Exército conspiravam abertamente e o Correio
da Manhã os incitava à rebelião. Os incidentes com o governo federal
tiveram prosseguimento pouco depois com a acusação a Epitácio de utilizar
forças federais para favorecer seu candidato ao governo de Pernambuco. Hermes
da Fonseca telegrafou ao comandante local concitando-o a “não ser o algoz do
povo pernambucano”. A reação do governo traduziu-se na prisão do marechal por
24 horas e no fechamento do Clube Militar. Essas medidas serviram de estopim
para a insurreição, que foi marcada para o dia 5 de julho.
No
dia 4 de julho, intensificaram-se no forte de Copacabana os preparativos para a
revolta. Siqueira Campos minou determinadas áreas do forte, enquanto Newton
Prado superintendeu o armazenamento de alimentos. Com as adesões que chegaram
nos últimos dias, o total de revoltosos na primeira fase da insurreição chegou a
301. A ligação do forte com o marechal Hermes era feita através de Eduardo
Gomes. A data aproximava-se, mas o governo deu o primeiro passo. O general
Bonifácio Gomes da Costa recebeu ordens do general Manuel Lopes Carneiro da
Fontoura, comandante da 1ª RM, para dirigir-se ao forte de Copacabana, sondar
as intenções dos revoltosos e passar o comando da unidade ao capitão José da
Silva Barbosa, que o acompanharia. No gabinete do capitão Euclides, entretanto,
o tenente Siqueira Campos deu ordem de prisão ao general Bonifácio e ao capitão
Barbosa, que foram mantidos presos até a manhã do dia 5.
Não
havia mais nada a esperar. Siqueira Campos iniciou o combate disparando o
primeiro tiro em direção à ilha de Cotunduba, atrás da qual estavam os
encouraçados São Paulo e Minas Gerais e o destróier Paraná.
Foram também alvejados o forte da ilha da Vigia, o 3º Regimento de
Infantaria (3º RI) — como protesto por ter esta unidade recebido o marechal
Hermes preso — e outros pontos-chave da cidade, onde morreram vários civis. A
Marinha começou a atacar e o forte preparou-se para reagir, mas um enguiço no
sistema hidráulico das torres dos canhões de maior alcance impediu que os
revoltosos respondessem com eficácia ao fogo dos navios.
Na
cidade, os pontos nevrálgicos permaneceram nas mãos de forças governistas,
várias unidades não aderiram à revolta e as que o fizeram — a Escola Militar do
Realengo e parte da Vila Militar — foram logo dominadas. Os sargentos do
general Carneiro da Fontoura tiveram vital importância, encarregados de
controlar os oficiais nos corpos de tropa e de sabotar os aviões no Campo dos
Afonsos, impedindo-os de levantar vôo. No forte de Copacabana ocorreram
deserções. O próprio Siqueira Campos incitou os que eram arrimos de família a
abandonarem o local. Restaram 29 revoltosos: cinco oficiais — o comandante
Euclides, Siqueira Campos, Eduardo Comes, Mário Tamarindo Carpenter e Newton
Prado —, dois sargentos, um cabo, 16 praças e cinco voluntários. Os oficiais
reuniram-se e decidiram enviar ao ministro da Guerra, através do capitão
Euclides, as três cláusulas de rendição: 1) respeito à vida dos
revolucionários; 2) baixa do Exército e 3) livre saída para o estrangeiro. O
capitão Euclides foi preso e levado para o palácio do Catete. O chefe do
Gabinete Militar telefonou para o forte de Copacabana e intimou os revoltosos a
se renderem. Caso isso não fosse feito, o capitão Euclides seria fuzilado.
Siqueira Campos, numa reunião, faz uma proposta extremada:
explodir o paiol de pólvora, morrendo a guarnição em seus postos. A sugestão
não foi aceita. Propôs então uma outra: os navios estavam fora do alcance dos
canhões, mas o forte podia continuar bombardeando objetivos militares na
cidade. Eduardo Gomes alegou que esta solução oferecia o risco de atingir a população
civil. Sua proposta foi que saíssem à rua em direção ao palácio do Catete,
enfrentando as forças do governo. Os 28 presentes concordaram. Siqueira Campos
dividiu a bandeira nacional em 29 partes, um pedaço para cada um, guardando o
pedaço destinado ao capitão Euclides.
Às
13:30h os revoltosos saltaram a barricada e, sob o comando de Siqueira Campos,
seguiram pela avenida Atlântica em direção ao Leme. Houve várias deserções, mas
um civil, Otávio Correia, aderiu aos revoltosos e recebeu o pedaço de bandeira
destinado ao capitão Euclides. A tropa do governo avançou e o tenente legalista
João de Segadas Viana tentou dissuadi-los do combate. O capitão Brasil
interveio e gritou com os revoltosos. Siqueira Campos reagiu arrancando os
botões de sua túnica e proclamando que não mais pertencia ao Exército. O
capitão Brasil deu ordem de atirar. Os 15 revoltosos abrigaram-se atrás do
paredão da calçada e responderam ao fogo, enfrentando durante pouco mais de 11
minutos o ataque das forças do Exército, da Polícia Militar e do Batalhão
Naval. Siqueira Campos, ferido na mão, atirou na boca do sargento Lindolfo
Garcia, que revidou enterrando-lhe a baioneta no fígado.
Dos
11 rebeldes que combateram as forças do governo no episódio que ficou conhecido
como “Os 18 do Forte”, Newton Prado, Mário Carpenter, José Pinto de Oliveira,
Pedro Ferreira de Melo e o civil Otávio Correia morreram na areia da praia ou
mais tarde no hospital; dois outros morreram meses mais tarde em conseqüência
dos ferimentos; Siqueira Campos e Eduardo Gomes foram feridos gravemente e os
dois restantes saíram ilesos ou com ferimentos leves.
O
presidente Epitácio Pessoa, numa tentativa de apaziguamento dos ânimos, visitou
os feridos no Hospital Central do Exército (HCE) e a iniciativa foi amplamente
divulgada pela imprensa. Siqueira Campos reagiu com altivez à tentativa de
diálogo do presidente da República. Em 14 de agosto, prestou depoimento no
inquérito presidido pelo general Augusto Tasso Fragoso. No início de setembro,
foi transferido para o 3º Regimento de Artilharia Montada, no interior do país,
onde ficou até o início de outubro, quando lhe foram concedidos mais 60 dias
para tratamento de saúde no HCE. Ao ter alta do Hospital, foi recolhido preso à
Escola de Comando e Estado-Maior, na Tijuca, de onde saiu com habeas-corpus concedido
pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Solicitou baixa do Exército em 7 de
janeiro de 1923, mas, ao ver seu pedido recusado, resolveu exilar-se no
Uruguai.
Denunciado
pelo promotor criminal da República, transferido para a segunda classe do
Exército por deserção, réu pronunciado pelo juizo da 1ª Vara Criminal por
atentado à Constituição e ao regime vigente, Siqueira Campos decidiu tentar a
carreira de comerciante em Montevidéu. Associado com seu colega da primeira
fase da insurreição do forte de Copacabana, o ex-aspirante Manuel Augusto de
Araújo Góis, fundou uma firma de representações, Araújo, Campos e Cia.,
dedicada à importação e venda de produtos primários brasileiros. Nos primeiros
meses de 1924, abriu em Buenos Aires a casa comercial Araújo, Siqueira &
Cia., Importación-Exportación, numa tentativa de vender café.
A Revolta de 1924
Em 5 de julho de 1924, no segundo aniversário da
Revolta de 1922, irromperam insurreições militares em Sergipe, Amazonas e São
Paulo. Nos dois primeiros estados a revolta foi dominada rapidamente, mas em
São Paulo, os rebeldes, comandados pelo general Isidoro Dias Lopes, ocuparam a
capital durante três semanas até que, expulsos pela ação conjunta das forças
policiais de Minas Gerais, São Paulo e Rio Grande do Sul, rumaram para oeste no
fim de julho. Conseguiram chegar a Mato Grosso, mas, devido à pressão
das forças legalistas, foram obrigados a atravessar o alto Paraná e ocuparam
Guaíra (PR).
Os
rebeldes de São Paulo foram fortalecidos com a adesão dos revolucionários de
1922 exilados no Uruguai e no Paraguai. Segundo o depoimento de um funcionário
da polícia aduaneira a Glauco Carneiro, Siqueira Campos teria integrado a
coluna do general Zeca Neto na Revolução Gaúcha de 1923 e, em princípios
de 1924, mantido novos contatos com os rebeldes gaúchos. O fato comprovado é
que, depois da Revolta de 1924, Siqueira Campos voltou às atividades
revolucionárias. Deixou Buenos Aires, onde as dificuldades de sua firma
obrigavam-no a lavar carros e a trabalhar como motorista, e, juntamente com
Aníbal Benévolo e Edgar Dutra, foi fazer o trabalho de aliciamento e as
ligações para deflagrar o movimento revolucionário no sul do Brasil.
Luís Carlos Prestes, que estava servindo em Santo Ângelo
(RS), assumiu a liderança do movimento. Siqueira Campos, escolhido por Prestes
para acertar os últimos detalhes entre os gaúchos e a Divisão São Paulo, partiu
na companhia de João Francisco e Anacleto Firpo (representante de Joaquim
Francisco de Assis Brasil) para conferenciar com Juarez Távota na cidade de Foz
do Iguaçu (PR), conquistada por este três dias antes.
Em Artigas, no Uruguai, Siqueira, Juarez, Firpo e Nemo
Canabarro Lucas encontraram o general Honório Lemes e, em Mello, o general Zeca
Neto. A seguir, enviaram carta a Prestes propondo que as forças revoltosas
avançassem em direção a Ponta Grossa (PR), para encontrar ali a Divisão São
Paulo. Siqueira Campos e Juarez fizeram ainda contatos com as guarnições de
Itaqui, Uruguaiana e Alegrete, no Rio Grande do Sul.
Em
25 de outubro, Juarez encontrou Siqueira Campos em Paso de Los Libres, na
Argentina, e fixou com os elementos militares de Uruguaiana o início do
movimento para a madrugada do dia 29. Coube a Juarez levantar a guarnição de
Uruguaiana, a Pedro Gay a guarnição de São Luís Gonzaga (RS) e a Prestes o
Batalhão Ferroviário de Santo Ângelo, enquanto Siqueira Campos deveria estar em
São Borja (RS) desde o dia 27, onde a chefia do movimento caberia ao capitão
Rui Zubaran, auxiliado pelos tenentes Aníbal Benévolo e Sandoval Cavalcanti e
pelo civil Dinarte Dornelles. Entretanto, Siqueira Campos se antecipou e na
noite do dia 28 sublevou nessa cidade o 2º Regimento de Cavalaria Independente
(2º RCI). Apresentado à tropa como o novo comandante, expôs os objetivos da
revolução, que seriam a derrubada do governo Bernardes, o fim dos vícios
eleitorais e a destruição das oligarquias. Na madrugada do dia 29, São Borja
foi ocupada e o tenente-coronel Eulálio Francisco Ribeiro, comandante da 1ª
Brigada de Cavalaria, foi preso juntamente com o coronel Amada Rodrigues,
comandante do 2º RCI. Na cidade ocupada, o jornal local Uruguai foi
transformado em órgão da revolução e Siqueira Campos mandou distribuir boletins
com o programa do movimento: a reforma do artigo 6º da Constituição, que
tratava da intervenção federal nos estados, para reforçar a autonomia estadual,
a unificação da justiça, a reforma do fisco, estabelecimento da obrigatoriedade
do ensino e a introdução do voto secreto e obrigatório. O boletim era assinado por
Isidoro Dias Lopes, Honório Lemes, Zeca Neto, Olinto Mesquita, Filipe Portinho,
Bernardo Padilha, Leonel Rocha e Miguel Costa.
Ao
final do dia 29, os revoltosos dominavam toda a fronteira gaúcha que ladeia o
rio Uruguai, com exceção de Itaqui, onde as forças legalistas, supervisionadas
pelo capitão Carneiro Pinto e por Osvaldo Aranha, no comando de quatrocentos
civis fortemente armados, haviam recebido o reforço de uma coluna de quinhentos
homens, procedente de Santiago (RS), sob o comando do tenente Honório dos
Santos. O ataque a Itaqui foi feito no dia 4 de novembro por colunas comandadas
por Juarez, Siqueira Campos e Aníbal Benévolo. Siqueira Campos recebeu o apoio
da 1ª Companhia do Batalhão Ferroviário e esperava ainda reforços de
Uruguaiana, mas estes chegaram tarde demais. Diante da superioridade do
inimigo, Siqueira Campos decidiu retirar-se para a Argentina.
Coluna Prestes
Em
novembro de 1924, Prestes escolheu São Luís Gonzaga para reunir as forças
remanescentes da revolução: o 1º Batalhão Ferroviário, o 3º RCI, parte do 2º
RCI e alguns civis. Depois de rápida permanência na Argentina, Siqueira Campos
foi se juntar a Prestes, assim que recebeu seu chamado. O núcleo inicial do que
seria denominado mais tarde Coluna Miguel Costa-Prestes abandonou em 27 de
dezembro São Luís Gonzaga, assim organizado: o 1º Batalhão Ferroviário sob o
comando do major Mário Portela Fagundes, substituído, após a morte, pelo major
Osvaldo Cordeiro de Farias, o 2º RC sob o comando do major João Alberto Lins de
Barros, e o 3º RC sob o comando do major João Pedro Gay, substituído depois
pelo major Antônio de Siqueira Campos.
O
objetivo da coluna gaúcha era fazer a junção com a Divisão São Paulo. Para
isso, sempre combatendo as forças legalistas, atravessou o rio Uruguai na foz do
rio Anta. Na localidade de Queimados, perto de Barracão (SC), Prestes empossou
Siqueira Campos no comando do 3º Destacamento. O major João Pedro Gay foi
destituído porque, argumentando com a inutilidade da revolução, tentava
convencer os soldados do seu destacamento a emigrar. A coluna chegou a Barracão
reduzida a oitocentos homens. Aí encontrou elementos da força enviada pelo
general Isidoro, comandados pelo coronel Fidêncio de Melo. O plano de Prestes
era marchar para o norte, atravessar o Paraná e São Paulo e atingir o Rio de
Janeiro, talvez por Minas Gerais. Dado o acirramento das forças legalistas
contra a Divisão São Paulo e a escassez de armamento, Prestes, cumprindo ordens
de Isidoro, dirigiu-se para Foz do Iguaçu. Em abril de 1925, a vanguarda da
coluna fez junção com a Divisão São Paulo no cruzamento das estradas de
Benjamim com Santa Helena, no Paraná.
Nesse
encontro ficou decidida a reorganização da coluna e a partida do general
Isidoro para a Argentina, seguido pelos oficiais paulistas que o quisessem
acompanhar, para organizar uma rede de auxilio externo ao movimento. A 1ª
Divisão Revolucionária, sob o comando geral do general-de-brigada Miguel Costa,
ficou organizada em duas grandes unidades: a Brigada Rio Grande, comandada por
Luís Carlos Prestes, formada pelos 1º, 2º e 3º destacamentos, comandados
respectivamente pelos tenentes-coronéis Osvaldo Cordeiro de Farias, João
Alberto Lins de Barros e Antônio de Siqueira Campos, e mais um corpo auxiliar,
constituído pelo 1º Esquadrão de Cavalaria Independente (ECI) comandado pelo
capitão Ari Salgado Freire, num total de oitocentos homens, e a Brigada São
Paulo, comandada pelo tenente-coronel Juarez Távora, formada pelos 2º e 3º
batalhões de Caçadores (BC), comandados pelos majores Mário Alves Lira e Mário
Virgílio R. dos Santos, o Batalhão de Artilharia Montada (BAM) comandado pelo
capitão Henrique Ricardo Holl, e o 2º ECI, comandado pelo capitão Jorge Danton,
num total de setecentos homens.
Em
29 de abril de 1925, a coluna terminou a travessia do rio Paraná, invadiu o
Paraguai e marchou em direção a Mato Grosso. A vanguarda na invasão de Mato
Grosso foi o destacamento João Alberto, que se juntou ao destacamento Siqueira
Campos para tomar a cidade de Ponta Porã (agora no estado de Mato Grosso do
Sul), que fora abandonada pela guarnição e invadida pelos paraguaios na cidade
de Pedro Juan Caballero. As forças regulares do coronel Péricles de
Albuquerque, que se retiraram da cidade, foram engrossadas pelas tropas
procedentes de Campo Grande (então no estado de Mato Grosso e atual capital de
Mato Grosso do Sul), sob o comando do major Bertoldo Klinger. Siqueira Campos e
João Alberto atacaram Klinger na cabeceira do rio Apa e obrigaram-no a se
retirar em direção a Campo Grande. Os dois destacamentos se encontraram com o
resto da coluna perto da estação de Rio Pardo, da Estrada de Ferro Noroeste. Em
16 de maio a coluna, novamente reunida, continuou sua marcha através de Mato
Grosso. Em 10 de junho, num lugar chamado Deserto de Camapuã, a coluna sofreu
nova estruturação. O comandante continuou sendo Miguel Costa, mas Juarez Távora
passou a subchefe e Prestes a chefe do estado-maior, tornando-se o comandante
de fato da coluna. Cordeiro de Farias, João Alberto e Siqueira Campos
continuaram no comando dos 1º, 2º e 3º destacamentos, sendo criado um quarto
destacamento sob o comando de Djalma Dutra. O destacamento de Siqueira tinha
como fiscal o capitão André Trifino Correia.
A
coluna atravessou Goiás, sempre combatendo as forças de Klinger e a polícia
goiana, galgou a serra do Paraná e ocupou São João do Pinduca (MG). Em 7 de
setembro voltou para Goiás e começou a marchar em direção ao Maranhão, onde
ocupou, em novembro, a cidade de Santo Antônio das Balsas, atual Balsas. O
destacamento Siqueira Campos, com o qual marchava Juarez, ocupou a vila de
Passagem Franca, sobre o rio Parnaíba, e dali foi encarregado de cortar as
ligações entre Nova Iorque (MA), Barão de Grajaú (MA) e Teresina. A partir de
28 de dezembro as forças de Juarez atacaram Teresina, enquanto as de Prestes
atacaram Flores, atual Timon. No dia 31 de dezembro, Prestes mandou Cordeiro de
Farias combinar com Juarez Távora e Miguel Costa o abandono do cerco de
Teresina e Flores e o começo da marcha para o leste, em direção a Pernambuco.
Nesse mesmo dia, Juarez foi feito prisioneiro quando fazia um reconhecimento
nas margens do Parnaíba, entre Areias e Caieiras.
A
coluna se reuniu na fazenda Cantinho e dali marchou para Pernambuco em 10 de
janeiro de 1926. Sempre combatendo, atravessou o Piauí, Ceará, Rio Grande do
Norte e Paraíba. Em 12 de fevereiro o grosso da tropa rebelde entrou em
Pernambuco, onde, além das forças federais, enfrentou a polícia estadual. O
destacamento Siqueira Campos, na vanguarda das forças, combateu na vila
Betânia, em Mulungu, em Campo Alegre e na vila de Jatobá.
No
dia 25 de fevereiro, a coluna iniciou a travessia do rio São Francisco e
invadiu a Bahia. De fevereiro a 3 de junho, percorreu a Bahia, entrou em Minas
e voltou à Bahia, suscitando nesses estados recepção adversa por parte da população
e enfrentando, além das tropas do governo e da polícia estadual, os cangaceiros
que passaram a combatê-la. O destacamento Siqueira Campos enfrentou os jagunços
de Horácio de Matos em Água da Rega e em Várzea e os cangaceiros de Franklin de
Albuquerque e Abílio Wolney em Taboleiro Alto e em Tombador.
Em julho, em território pernambucano, a coluna ocupou os
municípios de Murici e Ouricuri. Sempre combatendo, entrou no Piauí e, em 20 de
agosto, chegou a Goiás, onde armou uma emboscada na fazenda Piau para as tropas
do governo.
Entrou no estado de Mato Grosso em 15 de outubro, acampando
nas proximidades de Coxim (agora no estado de Mato Grosso do Sul), onde ficou
decidida a emigração para a Bolívia. Prestes e Miguel Costa, entretanto, não
quiseram tomar sozinhos a decisão de terminar a luta e enviaram emissários ao
marechal Isidoro e a Assis Brasil, solicitando-lhes instruções para agir.
Siqueira Campos, no comando de seu destacamento, foi designado para escoltar os
emissários, capitão Lourenço Moreira Lima, secretário-geral da coluna, e Djalma
Dutra, até as proximidades de Campo Grande. Além dessa missão, o destacamento
Siqueira Campos foi encarregado de atrair naquela direção os elementos
governistas que desde Goiás vinham perseguindo os revoltosos. Em 24 de outubro,
a coluna se separou. Siqueira Campos partiu com 80 homens em direção a Campo
Grande e o restante dos homens tomou a direção da Bolívia.
Siqueira Campos retornou a Goiás, onde, entre outras cidades,
ocupou a estação de Pires do Rio, à qual deu o nome de Prestes. Dali dirigiu-se
a Minas Gerais, onde ocupou Paracatu. Em 14 de fevereiro, voltou a Goiás com
destino à fronteira do Paraguai, onde penetrou no dia 23 de março de 1927 com
65 homens, dez dos quais seguiram-no até Assunção. Terminou assim a marcha da
Coluna Prestes que, através do Brasil, percorreu 13 estados e 25 mil
quilômetros, espalhando a mensagem revolucionária.
Articulação da Revolução de 1930
Instalado
em Buenos Aires a partir de abril de 1927, Siqueira Campos fez viagens
freqüentes a La Gaíba, na Bolívia, onde estava internada a coluna, para receber
instruções diretas de Prestes, e manteve contatos com a “República de Pocitos”,
centro de reunião dos exilados brasileiros em Montevidéu, onde tinham
residência fixa Renato Tavares, Augusto do Amaral Peixoto, Mário Alves e
outros. Para sobreviver, durante esse período, trabalhou esporadicamente em
topografia e no comércio.
A
separação entre os veteranos da coluna e o antigo quartel-general
revolucionário acentuou-se. Os primeiros eram chefiados por Prestes e
permaneciam em La Gaíba, enquanto os segundos, liderados por Isidoro, moravam
em Paso de los Libres. Tendo percebido que a dualidade La Gaíba-Paso de Los
Libres não agradava a Prestes, Siqueira Campos começou a articular a retirada
do poder das mãos de Isidoro, iniciando, em Montevidéu e Buenos Aires, a
implantação da mística de Prestes como “Cavaleiro da Esperança”. Não houve luta
pelo poder, pois Isidoro e Assis Brasil não fizeram objeção a que Prestes
assumisse a chefia do movimento.
Em
Buenos Aires, Siqueira Campos e João Alberto moravam numa loja onde todos os
dias era promovida uma mesa-redonda sobre problemas brasileiros. Com a
instalação de Prestes na capital argentina, Siqueira Campos e João Alberto
foram encarregados de reagrupar os revolucionários brasileiros, o primeiro
ocupando-se dos emigrados na Argentina e Uruguai e o segundo da rearticulação
dentro do Brasil.
Escasseavam os recursos para financiar os revolucionários.
A sugestão de Emídio Miranda, segundo depoimento próprio, foi
obter dinheiro através de um grande assalto. Recusada a idéia, Siqueira Campos
propôs conseguir financiamento russo através do Secretariado Sul-Americano do
Komintern, sediado em Montevidéu. Apesar da oposição de Prestes, que considerava
a tentativa prejudicial à causa revolucionária, um contato foi feito, mas as
conversações não avançaram porque o representante soviético achou Juarez
Távora, porta-voz do grupo, um “pólo negativo”. De 1928 em diante, com a
aquiescência de Prestes, Siqueira Campos fez freqüentes viagens clandestinas ao
Brasil e concentrou suas atividades revolucionárias no Rio e em São Paulo.
No
início de 1928, por exemplo, Siqueira Campos veio ao Rio com a identidade falsa
de Antônio de Toledo Câmara, professor e engenheiro, e, para ganhar a vida, fez
trabalhos topográficos nos arredores da cidade. A principal tarefa dos
revolucionários era recrutar os “tenentes”, jovens oficiais ou
aspirantes-a-oficiais, antes mesmo de sua formatura na Escola Militar do
Realengo. Siqueira Campos ensinou aos cadetes a técnica do golpe de mão e dos
assaltos a quartéis, mas o trabalho foi interrompido devido a delações. No
grupo que manteve relações com o “professor Toledo” incluíam-se Newton Estillac
Leal e Carlos da Costa Leite e os cadetes Juraci Magalhães, Agildo Barata e
Jurandir Mamede. O chefe de polícia do presidente Washington Luís, Oliveira
Sobrinho, descobriu a identidade do suposto professor e tentou armar uma
cilada. Desconfiado, Siqueira Campos recolheu-se “enfermo” à Casa de Saúde
Guanabara, onde ficou várias semanas sob os cuidados de seu amigo, o médico
Belmiro Valverde.
Em
junho de 1929, o Partido Comunista Brasileiro, então Partido Comunista do
Brasil (PCB) resolveu participar das eleições presidenciais de março de 1930
com um candidato próprio e pensou em convidar Prestes. No mês seguinte, Leôncio
Basbaum, representante dos comunistas, seguiu para Buenos Aires a fim de se
encontrar com o ex-chefe da Coluna Prestes, Siqueira Campos, que se encontrava
em Buenos Aires nessa época, admitia e desejava o apoio dos comunistas mas não
estava interessado em eleições. Para derrubar o governo, reivindicava apenas
“que o PCB lhe desse um batalhão de operários e alguns fuzis”. Prestes achou
que não lhe convinha candidatar-se e julgou o programa do PCB demasiado
extremista, mas apresentou uma contraproposta feita conjuntamente com Siqueira
Campos e Juarez. O PCB considerou inaceitável o novo programa, mas propôs a
continuação das negociações através do Bureau Sul-Americano do Komintern
em Buenos Aires.
Por
essa época, no Brasil, as correntes políticas de oposição lideradas por Minas
Gerais e o Rio Grande do Sul constituíram a Aliança Liberal, lançando a
candidatura de Getúlio Vargas à presidência da República em oposição a Júlio
Prestes, candidato oficial. Os revolucionários não estavam de acordo sobre a
aliança com os políticos aliancistas, em relação aos quais Prestes, Emídio
Miranda e outros tinham animosidade, achando que a união com eles deveria visar
somente a obtenção de fundos. Depois da vitória da revolução, os políticos da
Aliança Liberal deveriam ser abandonados na primeira oportunidade, enquanto se
aguardava o momento de fazer a revolução socialista. João Alberto, identificado
com Vargas e Osvaldo Aranha, achava que a união com os aliancistas era
providencial e que a revolução era uma aspiração comum aos dois grupos. A
posição de Siqueira Campos era semelhante à de Prestes e os dois só aceitaram a
união com os políticos quando estes se renderam à argumentação de que as reformas
políticas deveriam ser seguidas de reformas sociais.
Siqueira
Campos foi designado para articular a revolução em São Paulo. Chegando à
capital do estado no final de 1929, organizou para auxiliá-lo um grupo composto
por Mário Barbosa, Custódio de Oliveira, Ricardo Holl, Carlos e Jorge
Americano, Augusto Ribeiro, Joaquim Timóteo, Osvaldo Leite Ribeiro, Alberto
Araújo, seu irmão Raimundo de Siqueira Campos, Rui Fogaça, Ângelo Mendes
Correia Leal, Emídio Miranda e Nélson Tabajara de Oliveira. Entre os elementos
do Partido Democrático que também participaram do grupo estavam Paulo Nogueira
Filho, Paulo Duarte, Joaquim Celidônio, Elias Machado, Francisco Mesquita e
Aureliano Leite.
Os encontros se sucederam até janeiro de 1930, quando
Siqueira Campos foi abordado pela polícia nas vizinhanças do local das
reuniões. Emídio Miranda foi preso, mas Siqueira Campos, atirando num dos
policiais, conseguiu fugir e abrigar-se na redação de O Estado de S.
Paulo e, através de Júlio de Mesquita Filho, esconder-se na casa de um
amigo de Vicente Ancona, secretário do jornal. A essa altura, a polícia já
tinha prendido Aristides Leal e Djalma Dutra. Siqueira Campos telefonou aos
outros revolucionários comunicando as prisões e intimando-os a fugir.
Ainda no início de 1930, Prestes encontrou-se com Getúlio
Vargas. Pouco depois, realizou-se em Porto Alegre uma reunião da qual
participaram Prestes, Siqueira Campos, João Alberto, Miguel Costa, os irmãos
Etchegoyen, Estillac Leal, Djalma Dutra, Emídio Miranda, Trifino Correia e
outros. No encontro, foram atribuídas tarefas aos chefes revolucionários em
diversos pontos do território nacional. Com a derrota da Aliança Liberal nas
eleições de março, os aliancistas intensificaram também, por seu lado, os
preparativos para um movimento armado.
A
preocupação principal de Siqueira Campos era criar as condições para que São
Paulo pudesse secundar o Rio Grande do Sul ao primeiro aviso da revolução. Para
isso, providenciou a fabricação de granadas de mão e planejou a dinamitação da
Central de Polícia de São Paulo. A organização do levante no estado era a
seguinte: Paulo Nogueira Filho entraria com um forte contingente de
correligionários do Partido Democrático, aos quais fora entregue grande
quantidade de granadas de mão. No setor militar, Job de Figueiredo, Varonil de
Albuquerque Lima e outros promoveriam levantes. Tudo estava combinado quando
Emídio Miranda — que conseguira fugir da prisão — entregou a Siqueira Campos
uma cópia do manifesto que Prestes preparava para lançar à nação. Após ler o
documento, Siqueira decidiu partir para Buenos Aires ao encontro do ex-chefe da
coluna. Ao passar pelo Rio, recebeu a notícia de que Orlando Leite Ribeiro
conseguira comprar armamento na Tchecoslováquia e ia embarcá-lo em Hamburgo, na
Alemanha, com destino ao Rio Grande do Sul.
Em
Buenos Aires, Siqueira Campos, João Alberto e Miguel Costa tentaram durante um
dia inteiro convencer Prestes a retardar para depois da eclosão do movimento o
pronunciamento em que atacava a Aliança Liberal como reformista e
contra-revolucionária. O único ponto em que Siqueira Campos discordava de
Prestes era quando este se declarava taxativamente contra o pagamento da dívida
externa. Finalmente, os três conseguiram obter o prazo de um mês para que fosse
tentada a revolução no Brasil, depois do qual Prestes voltaria a ser de novo o
chefe absoluto dos revolucionários. Após essa reunião, Siqueira Campos recebeu
carta de Rosalina Coelho Lisboa indagando se valeriam a pena os esforços dos
revolucionários, pois eles não encontravam o mínimo reconhecimento por parte da
maioria de seus patrícios. Siqueira Campos respondeu com uma frase que ficou
célebre: “À Pátria tudo se deve dar e nada pedir — nem mesmo compreensão”. Em
seguida, enviou um telegrama a seu irmão Raimundo, no Rio, dizendo que estaria
presente à sua festa de aniversário, e outro a Maurício Goulart, pedindo
“Esperem-me armados Aeropostale”.
O
avião em que embarcara Nélson da Costa (João Alberto) e Carlos de Oliveira
(Siqueira Campos) decolou à 1:55h da madrugada do dia 10 de maio de 1930 de
Buenos Aires. Em São Paulo, armados de metralhadoras e granadas de mão,
aguardavam-no Carlos e Jorge Americano Freire, Oscar Pedroso Horta, Mário
Barbosa e Rafael Correia de Oliveira. Por volta das três e meia da madrugada,
entretanto, o avião caiu nas águas do rio da Prata. Siqueira Campos foi
acometido de um ataque cardíaco e morreu afogado. O único sobrevivente dos
cinco membros da tripulação foi João Alberto.
Como
o governo Washington Luís proibisse aos navios brasileiros trazerem o corpo de
Siqueira Campos, este foi trasladado para o cemitério central de Montevidéu com
grande acompanhamento, tendo à frente Prestes. Em 24 de maio, o corpo deixou
Montevidéu no navio francês Kerguellen, chegando ao Rio, onde uma
multidão o esperava no dia 3 de junho. Formou-se um grande cortejo em direção à
Igreja Santa Cruz dos Militares, onde o corpo ficou exposto. Embarcado para São
Paulo no dia 4, foi levado para a Igreja do Carmo e sepultado dois dias depois
no Cemitério da Consolação.
Durante a sua vida militar passou mais tempo na ilegalidade
do que em serviço regular. Após a vitória da Revolução de outubro de 1930, foi
promovido post-mortem a capitão, em 15 de novembro seguinte — em virtude
do decreto de anistia de 11 desse mês — e a major em 8 de janeiro de 1931. Seu
nome foi dado à rua Barroso, em Copacabana, no Rio de Janeiro.
Glauco Carneiro escreveu sua biografia, intitulada O
revolucionário Siqueira Campos; a epopéia dos 18 do Forte e da Coluna
Prestes na biografia do lendário tentador do impossível, herói do
tenentismo (1966, 2v.).
Jorge
Laclette
FONTES: ABRANCHES,
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Novo dic. de história; Personalidades; SILVA, H. 1922; SILVA,
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