ANDRADE,
Auro de Moura
*dep. fed. SP 1951-1955; sen. SP 1955-1968 e 1969-1971.
Auro Soares de Moura Andrade nasceu em Barretos (SP) no dia 19 de setembro de 1915, filho
de Antônio Joaquim de Moura Andrade e de Guiomar Soares de Moura Andrade. Seu
pai foi conhecido fazendeiro, comerciante e industrial naquela cidade do norte
de São Paulo.
Fez o curso primário no Liceu Franco Brasileiro e o
secundário no Liceu Nacional Rio Branco, ambos em sua cidade natal. Tendo
concluído os estudos secundários, foi para a cidade de São Paulo, onde
ingressou na Escola Normal Caetano de Campos. Em 1932, aos 17 anos, participou
da Revolução Constitucionalista de São Paulo, movimento político que
reivindicava a reconstitucionalização do país, combatendo na frente situada na
região de Cunha (SP) de julho a agosto. Em setembro foi transferido para a
Frente de Campinas (SP), onde caiu prisioneiro das tropas federais comandadas
pelo coronel Eurico Gaspar Dutra. Após as derrotas em Cunha e Campinas,
ocorridas naquele mês, começaram as negociações para a trégua. Em 2 de outubro,
finalmente, foi assinado o armistício entre São Paulo e o governo federal.
Em fins de 1932, concluiu o curso de psicologia, lógica e
pedagogia na Escola Caetano de Campos. Em 1934, reiniciou os estudos
ingressando na primeira turma da Faculdade de Direito depois que essa
instituição passou a integrar a Universidade de São Paulo, inaugurada naquele
mesmo ano. Enquanto acadêmico, desenvolveu intensa atividade política, pautada
pelo combate ao governo do presidente Getúlio Vargas. Nesse período, trabalhou
como jornalista, tendo sido redator-chefe de diversos periódicos e participado
da fundação dos jornais O Democrata e A Urna. Com a implantação
do Estado Novo em 10 de novembro de 1937, a extinção dos partidos políticos e a introdução da censura à imprensa, a atividade jornalística sofreu severas
restrições. Diversos jornais, entre eles A Urna e O Democrata foram
retirados de circulação pela censura estado-novista ainda em 1937. A seguir Moura Andrade criou o jornal Folha Dobrada, que teve um fôlego pouco maior,
resistindo até 1938, quando também foi fechado pelo governo.
Além disso, trabalhou como redator na revista Alvares de
Azevedo.
Orador oficial da diretoria do Centro Acadêmico XI de Agosto,
função que exerceu até sua formatura em fins de 1938, Moura Andrade passou a
exercer a profissão de advogado nos foros da capital e do interior. Em 1941,
foi assessor jurídico e consultor técnico da Comissão de Estudos, Organização e
Desenvolvimento da Lavoura Paulista junto à Secretaria de Agricultura, na
interventoria de Fernando Costa. No período de 1942 a 1943, foi assessor jurídico e consultor econômico da presidência da Coordenação de Mobilização
Econômica, órgão criado pelo governo federal em setembro de 1942 com o objetivo
de assegurar a articulação da economia brasileira frente aos problemas causados
pela eclosão da Segunda Guerra Mundial. Durante os anos de 1943 e 1944 exerceu
o cargo de diretor conselheiro e presidente interino da Comissão Geral de Preços,
órgão vinculado àquela coordenação. Em 1944, foi eleito para a direção da
Associação Comercial de São Paulo.
Desde o final de 1944, participou das articulações para o
lançamento da candidatura do brigadeiro Eduardo Gomes à presidência da
República, ocorrido em 22 de fevereiro de 1945. Este movimento foi um dos
pontos de partida para a formação da União Democrática Nacional (UDN), que
congregou a oposição legal ao governo de Getúlio Vargas, formada por membros
das oligarquias tradicionais, além de liberais e socialistas. Participou
intensamente da campanha eleitoral promovida por esta corrente que, em 7 de
abril de 1945, organizou-se como partido político. As eleições para a
presidência da República realizaram-se finalmente em 2 de dezembro de 1945, já
após a deposição de Vargas (29/10/1945), dando a vitória ao candidato apoiado
pelo Partido Social Democrático (PSD), general Eurico Gaspar Dutra, que superou
por uma diferença considerável de votos o candidato udenista Eduardo Gomes.
Em 1946, assumiu a função de diretor-superintendente da
revista Digesto Econômico, publicação da Associação Comercial de São
Paulo e da Federação do Comércio do Estado de São Paulo. Nesse mesmo ano
retirou-se da diretoria da Associação Comercial.
A carreira política
Em janeiro de 1947, no mesmo pleito em que Ademar de Barros foi eleito governador de São Paulo, Moura Andrade elegeu-se deputado à
Assembléia Constituinte paulista na legenda da UDN. Após a promulgação da nova
Constituição, em 9 de julho do mesmo ano, passou a exercer o mandato ordinário
e foi eleito líder da oposição. Foi ainda presidente da Comissão de
Constituição e Justiça, da Comissão Especial de Defesa da Lavoura e membro da
Comissão de Finanças da Assembléia Legislativa paulista.
Em outubro de 1950, elegeu-se deputado federal ainda na
legenda da UDN. Deixando a Assembléia em janeiro de 1951, assumiu o mandato em
fevereiro seguinte e nesse mesmo ano desligou-se daquela agremiação,
permanecendo sem partido durante algum tempo. Desenvolveu uma atividade
parlamentar marcadamente técnica, tendo integrado a Comissão de Tratados e
Diplomacia e a Comissão de Finanças da Câmara. Já filiado ao Partido Democrata
Cristão (PDC), em meados de 1952, durante as discussões no Congresso sobre o
projeto de criação de uma companhia de pesquisa, exploração e comercialização
do petróleo nacional, manifestou-se contra o monopólio estatal do petróleo.
Alinhou-se nessa posição com a maioria governista formada pelo PSD e pelo
Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), tendo-se destacado como defensor da
posição governamental contra as emendas propostas pelo udenista baiano,
deputado Aliomar Baleeiro. Seu posicionamento, por exemplo, ante a discussão do
critério de distribuição da receita do imposto único sobre combustíveis
líquidos e lubrificantes coincidia com a tese defendida pelo governo, que
advogava que aquele imposto beneficiasse os estados brasileiros de maior
produção petrolífera. Em 3 de outubro de 1953, foi finalmente aprovada a Lei nº
2.004, que criou a Petrobras, instituindo o monopólio estatal do petróleo.
Em 1954, Moura Andrade transferiu-se para o PTB, onde
permaneceu por pouco tempo, filiando-se, no mesmo ano, ao Partido Trabalhista
Nacional (PTN). Em outubro de 1954, concorreu ao Senado por São Paulo na
legenda do PTN, elegendo-se com 551.599 votos.
Tomou posse em 19 de fevereiro de 1955, após concluir o
mandato de deputado federal, e dois meses depois, em 29 de março, participou da
convenção nacional do PTN. Nessa ocasião, o partido assumiu oficialmente o
apoio à candidatura do governador mineiro, Juscelino Kubitschek, do PSD, à
presidência da República. Moura Andrade foi então indicado como candidato à
vice-presidência, tendo sido apoiado pelo governador paulista Jânio Quadros.
Seu nome, contudo, não encontrou maior sustentação política no interior do
próprio PTN. No decorrer dessa legislatura transferiu-se para o PSD.
Logo a seguir foi encarregado por Jânio Quadros de, ao lado
de Olavo Fontoura, iniciar negociações relativas à sucessão presidencial com o
senador Reginaldo Fernandes, da UDN do Rio Grande do Norte, representante do
presidente da República, João Café Filho. Jânio Quadros estava disposto a
desistir da sua candidatura à presidência da República caso fosse possível uma
maior participação paulista na composição do futuro governo. Em 2 de abril, um
encontro entre Reginaldo Fernandes e Jânio selou as bases do novo acordo: o
governo paulista estaria representado em dois ministérios e na presidência do
Banco do Brasil em troca do seu apoio à candidatura Juarez Távora-Bento Munhoz
da Rocha. O documento que especificou os pontos negociados foi assinado por
Jânio Quadros, José Adriano Marrey Júnior, Carlos Alberto de Carvalho Pinto,
Olavo Fontoura, Reginaldo Fernandes, Moura Andrade e pelo próprio Café Filho.
Em seguida à assinatura do que ficou conhecido como Acordo Jânio-Café, Jânio
Quadros abriu mão de sua candidatura à presidência, apenas duas horas antes de
se esgotar o prazo para a desincompatibilização de cargos dos candidatos ao
próximo pleito.
Mesmo enfrentando a forte oposição de setores antigetulistas
das forças armadas, Juscelino Kubitschek conseguiu eleger-se presidente da
República em outubro de 1955. Um mês depois, em 3 de novembro, Café Filho
adoeceu, sendo substituído no cargo pelo presidente da Câmara dos Deputados,
deputado Carlos Luz. Diante dos rumores de que Luz participava de uma
conspiração articulada por militares e civis antigetulistas contra a posse de
Juscelino, no dia 11 de novembro o ministro da Guerra, general Henrique Teixeira
Lott, afastou-o da presidência, passando o cargo ao vice-presidente do Senado,
Nereu Ramos. No dia 21, Café Filho, já recuperado, tentou reassumir o cargo, no
que foi impedido pelas forças armadas. O Congresso Nacional reuniu-se no dia
seguinte, tendo a grande maioria dos seus membros, entre eles Moura Andrade,
votado a favor de seu impedimento.
No ano seguinte, 1956, Moura Andrade viajou à Hungria como
enviado especial do Senado Federal, com o objetivo de iniciar negociações
visando o estabelecimento de relações diplomáticas entre o Brasil e aquele país
socialista. Em 1958 foi eleito vice-líder da maioria no Senado, cargo que
ocupou até o ano seguinte. Em 1959 foi eleito líder da maioria na mesma casa e
participou como delegado do Brasil, juntamente com o ministro das Relações
Exteriores, Horácio Láfer, e o deputado Francisco Clementino San Tiago Dantas, da V Reunião de Consulta dos Ministros das Relações Exteriores dos Estados Membros
da Organização dos Estados Americanos, em Santiago do Chile. Nessa reunião, foi
aprovada por unanimidade a Declaração de Santiago, da qual Moura
Andrade foi um dos autores. Foi também delegado do Brasil à V Conferência sobre
Organização da Aviação Civil Internacional (OACI), em Roma.
Na presidência do Senado
Em março de 1961, assumiu o cargo de vice-presidente do
Senado Federal, posto que correspondia de fato à presidência da casa, exercida
formalmente pelo vice-presidente da República. Em 25 de agosto recebeu do
ministro da Justiça, Oscar Pedroso Horta, a notícia sobre a renúncia do
presidente Jânio Quadros e convocou em seguida uma reunião extraordinária do
Congresso, na qual narrou os recentes acontecimentos. Frente à posição de
alguns congressistas propondo que o Congresso não aceitasse a renúncia,
declarou que a decisão do presidente não dependia da deliberação do Congresso
e, assim, proclamou a vacância do cargo.
O substituto legal de Jânio, o vice-presidente João Goulart,
do PTB, encontrava-se em viagem oficial ao Extremo Oriente. Por este motivo, a
presidência foi ocupada interinamente por Pascoal Ranieri Mazzilli, presidente
da Câmara dos Deputados. Entretanto, Goulart teve sua posse vetada pelos
ministros militares — marechal Odílio Denis, da Guerra, vice-almirante Sílvio
Heck, da Marinha, e brigadeiro Gabriel Grün Moss, da Aeronáutica. Diante do
impasse político assim criado, Moura Andrade propôs a formação de uma comissão
mista de senadores e deputados com o objetivo de estudar possíveis meios de
superar a crise.
Em 2 de setembro de 1961, foi aprovada a Emenda
Constitucional nº 4, através da qual foi instituído no Brasil o sistema
parlamentarista, forma política conciliatória que possibilitou a posse de
Goulart. Nessa ocasião, Moura Andrade enviou ofício ao presidente Ranieri
Mazzilli no qual exigia garantias do governo e das forças armadas para o
desembarque e permanência de João Goulart em Brasília e para a sua posse.
Em 7 de setembro, Goulart foi finalmente empossado como presidente da República
por Auro de Moura Andrade, na qualidade de presidente do Congresso Nacional. A
presidência do Senado Federal, de acordo com modificações constitucionais
trazidas pelo sistema parlamentarista recém-instituído, deixou de ser
atribuição do vice-presidente da República, devido à inexistência desse cargo
sob o parlamentarismo. Meses depois, em 11 de março de 1962, Moura Andrade foi
eleito presidente do Senado, ocupando este cargo pela segunda vez consecutiva.
Em 2 de julho de 1962, após a fracassada tentativa de formar
um gabinete presidido por Francisco Clementino de San Tiago Dantas, Goulart convidou Moura Andrade para o cargo de primeiro ministro, apesar da
oposição dos órgãos sindicais integrantes do Comando Nacional de Greve — entre
os quais a Confederação Nacional de Trabalhadores na Indústria (CNTI), o Pacto
de Unidade e Ação (PUA) e a Confederação Nacional de Trabalhadores em
Estabelecimentos de Crédito (Contec). As lideranças sindicais ameaçaram deflagrar
greve geral caso a indicação de Moura Andrade se efetivasse. Encaminhado ao
Congresso, seu nome foi aprovado por 262 votos contra 51.
Segundo Muniz Bandeira, Moura Andrade havia-se comprometido
com Goulart que só formaria um gabinete composto de nomes por ele aprovados.
Como garantia, teria lhe dado uma carta de renúncia ao cargo, para ser usada a
qualquer momento. Entretanto, pressionado pela maioria do Congresso Nacional,
Moura Andrade tentou compor um gabinete formado por elementos contrários à política
reformista do presidente. Diante da não-aprovação de Goulart, em 4 de julho
Moura Andrade renunciou à indicação sem ter chegado a assumir o cargo. Mesmo
assim, o Comando Nacional de Greve decretou greve geral por 24 horas no dia 5
de julho. Foi então escolhido primeiro-ministro o gaúcho Francisco de Paula
Brochado da Rocha. Em outubro de 1962, Moura Andrade reelegeu-se senador por
São Paulo, apoiado por uma coligação formada pelo PSD — partido para o qual se
transferira —, pelo Partido Social Progressista (PSP) e pelo Partido de
Representação Popular (PRP), obtendo 1.060.667 votos.
Em 6 de janeiro de 1963, realizou-se um plebiscito nacional
convocado pelo presidente João Goulart, que aprovou a extinção do regime
parlamentarista e o retorno ao sistema presidencialista de governo. Em 18 do
mesmo mês, durante as discussões sobre a revogação da Emenda Constitucional nº
4, Moura Andrade propôs a alteração do artigo 61 da Constituição de 1946, que
atribuía a presidência do Senado ao vice-presidente da República. Em 23 de
janeiro, ao lado do deputado Ranieri Mazzilli, promulgou a emenda
constitucional que revogou aquela que instituía o regime parlamentarista
no Brasil.
Em 2 de fevereiro, foi reeleito presidente do Senado numa
eleição bastante difícil, pois além da oposição de Goulart e do PTB à sua
candidatura, mais três senadores, Filinto Müller, Jefferson Aguiar e Vitorino
Freire, disputaram o cargo. Em 5 de julho, inaugurou a “Hora do Congresso” no
programa radiofônico A Voz do Brasil. Em seu discurso, afirmava que o
Congresso Nacional constituía a instância máxima das liberdades públicas.
Em 9 de setembro de 1963, em função da decisão do Supremo
Tribunal Federal de negar a elegibilidade dos sargentos, quinhentos sargentos
do Exército, Marinha e Aeronáutica rebelaram-se em Brasília, ocupando alguns
prédios públicos do Distrito Federal. A rebelião foi debelada no mesmo dia e,
nessa ocasião, Moura Andrade declarou que esse episódio expressava o gravíssimo
processo de subversão institucional que dominava o país. Em novembro foi para
Washington como enviado especial do Senado Federal para os funerais do
presidente norte-americano John Kennedy, assassinado no dia 22 daquele mês.
Ainda em 1963, chefiou a delegação do Senado Federal que viajou ao Vaticano, a
convite do papa João XXIII.
Em 10 de março de 1964, foi reeleito pela terceira vez
consecutiva presidente do Senado, enfrentando a oposição cada vez maior dos
representantes do governo no Congresso.
Em 13 de março, realizou-se o grande comício em prol das
reformas de base — conjunto de reformas de cunho socioeconômico e político —
propostas por Goulart, ao qual estiveram presentes cerca de cem mil pessoas, na
sua maioria trabalhadores. A participação do presidente João Goulart no comício
e o conteúdo do seu discurso acirrou o clima de tensão política existente desde
a sua posse.
No dia 15 de março, durante a solenidade de abertura do
Congresso Nacional, Moura Andrade declarou que as relações entre o Poder
Legislativo e o Poder Executivo estavam deterioradas e prestes a um rompimento
político. Em 19 de março, o senador participou e discursou na Marcha da Família
com Deus pela Liberdade em São Paulo, organizada por entidades contrárias ao
governo de Goulart.
No
dia 30, após a solenidade em homenagem a Goulart organizada pelos sargentos na
sede do Automóvel Clube do Brasil do Rio de Janeiro, Moura Andrade lançou um
manifesto à nação no qual declarava o rompimento entre o Legislativo e o
Executivo. No final do manifesto, fazia um apelo às forças armadas e “a todos
que desejavam a liberdade para que se mobilizassem visando o restabelecimento
da ordem constitucional e a defesa da democracia brasileira”.
O movimento político-militar de 1964
Em 31 de março, o general Olímpio Mourão Filho, comandante da
4ª Região Militar, sediada em Juiz de Fora (MG), decidiu deslocar suas tropas
em direção ao Rio de Janeiro, iniciando assim o movimento político-militar
contra João Goulart. Em 2 de abril, consolidada a deposição de Jango com a sua
fuga de Brasília, Moura Andrade convocou o Congresso Nacional declarando vago o
cargo de presidente da República. Após intensa discussão sobre se Goulart havia
ou não abandonado o cargo, Pascoal Ranieri Mazzilli, presidente da Câmara dos
Deputados, foi empossado interinamente, mais uma vez, na presidência da
República. O poder efetivo da nova ordem política, entretanto, ficou
concentrado nas mãos do Comando Supremo da Revolução, junta militar formada
pelos ministros da Guerra, general Artur da Costa e Silva, da Marinha,
almirante Augusto Rademaker, e da Aeronáutica, brigadeiro Francisco de Assis
Correia de Melo. Em 4 de abril, Moura Andrade assumiu o compromisso com a junta
militar de antecipar as eleições para a presidência da República.
No interior das forças vitoriosas, duas tendências se
formavam: uma, que advogava o combate à oposição dita subversiva através da
utilização dos mecanismos constitucionais em vigor; e outra, que defendia o
acirramento da repressão policial, propondo, inclusive, a cassação dos
mandatos. Essa segunda tendência era representada, no interior das forças
armadas, pelos oficiais da chamada “linha dura”. Moura Andrade se alinhou à
tendência legalista, manifestando-se contra as cassações e punições em massa. Em 9 de abril, porém, a junta militar promulgou o Ato Institucional nº 1 (AI-1), que
suprimiu as garantias constitucionais vigentes, permitiu a suspensão de
direitos políticos e a cassação de mandatos, conformando a linha política
dominante do regime recém-instaurado. O AI-1 fixava ainda a eleição pelo
Congresso para presidente e vice-presidente da República, dentro de 48 horas a
contar daquela data.
O candidato indicado pela junta para a presidência foi o
general Humberto de Alencar Castelo Branco, último chefe do Estado-Maior do
Exército no governo João Goulart. Disputando com as candidaturas do general
Eurico Gaspar Dutra e do general Amauri Kruel, Castelo saiu vencedor por grande
maioria de votos, pois contava com o apoio de grande parte da oficialidade e
das forças políticas mais atuantes. Para o cargo de vice-presidente, porém, a
disputa entre as candidaturas de Moura Andrade e José Maria Alkmin, deputado
pessedista mineiro, foi mais intensa. Somente no segundo escrutínio, após a
desistência de Moura Andrade, Alkmin foi eleito para o cargo.
Em 21 de outubro de 1964, os encarregados militares do
Inquérito Policial Militar (IPM) da Caixa Econômica de São Paulo denunciaram a
participação de Moura Andrade e Ranieri Mazzilli em corrupção administrativa e financeira
naquela entidade. A denúncia contra Moura Andrade provocou reações e protestos
no interior do Congresso, pois baseava-se em dados vagos e extremamente
inconsistentes. Moura Andrade, que se encontrava na Alemanha Ocidental,
abandonou o tratamento de saúde a que estava se submetendo, retornando
imediatamente ao Brasil
Em 26 de outubro, em entrevista à imprensa, afirmou que o
objetivo das denúncias era desmoralizar o Congresso Nacional, envolvendo os
presidentes das duas casas legislativas no escândalo da Caixa Econômica. Moura
Andrade concluía sua declaração alertando a nação para o perigo iminente de
fechamento do Congresso. Suas palavras, interpretadas pelos militares como uma
tentativa de escapar ao inquérito, tiveram grande repercussão junto aos meios
políticos e governamentais.
Dois dias depois Moura Andrade fez novas declarações aos
jornais, dizendo-se disposto a abrir mão de suas imunidades parlamentares a fim
de facilitar a apuração das denúncias. No entanto, essa demonstração de boa
vontade com as autoridades não foi suficiente para abrandar a oposição
dominante na presidência da República aos sucessivos mandatos exercidos por ele
e Mazzilli na presidência do Senado e da Câmara dos Deputados, respectivamente.
Ainda assim, Moura Andrade logrou manter-se no cargo, reelegendo-se pela quarta
vez consecutiva em 24 de fevereiro de 1965. O apoio do senador Daniel Krieger,
líder do governo no Senado, à sua candidatura foi determinante para sua
reeleição, uma vez que o próprio presidente Castelo Branco já se manifestara
abertamente contrário à perpetuação dos mesmos nomes na presidência das duas
casas do Congresso.
Em 22 de março de 1965, ao se realizarem eleições diretas
para as prefeituras municipais, cujos ocupantes terminavam seus mandatos
naquele ano, Moura Andrade candidatou-se à prefeitura de São Paulo na legenda
do PSD, contando com o apoio do governador paulista Ademar de Barros. Seu nome
porém foi visto com apreensão nos círculos dirigentes, que o consideravam uma
figura hostil ao governo. Concorreram à sucessão do prefeito Francisco Prestes
Maia seis candidatos. As eleições foram cercadas de muita tensão devido ao
grande número de concorrentes e ao temor governamental dos resultados
eleitorais. Saiu vitorioso o candidato apoiado pelo ex-presidente Jânio
Quadros, o brigadeiro José Vicente Faria Lima, sendo Laudo Natel, apoiado pelo
ministro da Guerra, general Artur da Costa e Silva, o segundo mais votado.
Moura Andrade obteve o terceiro lugar na preferência do eleitorado, seguindo-se
a ele o deputado Franco Montoro, o senador Lino de Matos e, finalmente, Paulo
Egídio Martins, candidato apoiado pelos círculos políticos e militares
dominantes, lançado à última hora.
Em outubro de 1965, os candidatos oposicionistas Francisco
Negrão de Lima e Israel Pinheiro foram eleitos governadores, respectivamente da
Guanabara e de Minas Gerais, provocando um intenso movimento dos militares da
“linha dura” para impedir a posse de ambos. Em conseqüência desses fatos, o
governo enviou ao Congresso Nacional um projeto de reformas que visavam o
aumento dos poderes do Executivo, especialmente nos casos de intervenção
federal nos estados, provocando o cerceamento da atuação do próprio Congresso.
A oposição decidiu fechar questão contra o projeto e em 25 de outubro, às vésperas
de se esgotar o prazo para a votação, em encontro com o ministro da Justiça,
Juraci Magalhães, Moura Andrade propôs que a definição dos rumos do processo
revolucionário inaugurado em 1964 se fizesse através da edição de medidas que
seriam remetidas pelo presidente ao referendo do Congresso, a quem caberia o
papel de aceitá-las ou recusá-las na sua totalidade, já que não se poderia
propor emendas ao projeto original. Juraci retrucou afirmando que caso a
oposição não alterasse seu posicionamento, o governo editaria um novo ato
institucional, que promoveria as reformas políticas pretendidas pelo regime
militar. Moura Andrade dispôs-se a rediscutir a questão, caso fosse possível
adiar a votação do projeto marcada para o dia seguinte. Dois dias depois, em 27
de outubro, o governo editou o AI-2, que reabriu o processo de suspensão de
direitos políticos e de cassações de mandatos parlamentares, extinguiu os
partidos e estabeleceu eleições indiretas para a presidência da República,
impondo, assim, medidas muito mais fortes do que as que tinham sido submetidas
ao Congresso Nacional.
Em 28 de fevereiro de 1966, Moura Andrade foi mais uma vez
eleito para a presidência do Senado. Em abril seguinte, o presidente Castelo
Branco nomeou uma comissão encarregada de elaborar a nova Constituição, que
daria forma jurídica legal ao movimento político-militar de 1964. Para esta
comissão foram nomeados os ministros Levi Carneiro, Miguel Seabra Fagundes,
Temístocles Cavalcanti e Orosimbo Nonato. A forma encontrada para a elaboração
da nova Carta recebeu, porém, fortes críticas de diversos parlamentares, o que
originou a criação de um movimento pelo retorno das prerrogativas constituintes
e legislativas do Congresso no interior das duas casas. Mesmo tendo ingressado
na recém-criada Aliança Renovadora Nacional (Arena) — partido identificado com
a política governamental —, Moura Andrade, junto com outros arenistas,
compartilhou das críticas ao projeto, basicamente quanto à forma de
participação do Congresso no processo de elaboração da nova Constituição.
Em
maio de 1966, a candidatura do marechal Artur da Costa e Silva para a sucessão
do presidente da República foi lançada pelo próprio marechal Castelo Branco.
Vários nomes foram selecionados para o cargo de vice-presidente, inclusive o do
senador paulista, que, no entanto, não foi aceito pela denominada “linha dura”
das forças armadas. O nome do deputado udenista mineiro, Pedro Aleixo, sugerido
por Daniel Krieger, foi finalmente escolhido. Assim, em 26 de maio de 1966, a convenção nacional da Arena homologou as candidaturas de Costa e Silva e Pedro Aleixo para
presidente e vice-presidente da República.
Em agosto de 1966, recém-chegado de uma viagem à Europa,
Moura Andrade convocou reunião com o presidente da Câmara dos Deputados, Adauto
Lúcio Cardoso, e os líderes do governo, senador Daniel Krieger e deputado
Filinto Müller, para discutirem a participação do Congresso Nacional na
elaboração da nova Constituição. Sua preocupação era o crescente esvaziamento
das funções do Congresso em face da absorção das faculdades constituintes e
legislativas pelo Poder Executivo. Nessa ocasião, iniciaram-se conversações
entres os líderes do governo no Congresso e o presidente das duas casas. Ainda
em agosto, Moura Andrade e Adauto Lúcio Cardoso, em reunião com Costa e Silva,
defenderam a importância da manutenção das prerrogativas do Congresso em
matérias referentes à Constituição. Dias depois, em encontro com o próprio
Castelo Branco, ambos defenderam a revogação do artigo 15 do AI-2, que atribuía
ao presidente da República o poder de cassar mandatos e suspender os direitos
políticos, como condição imprescindível para que o Congresso examinasse com
liberdade o projeto de Constituição. Moura Andrade defendeu a necessidade de
que o Congresso fosse investido de poderes soberanos para cumprir a tarefa de
revisão constitucional. Em 3 de outubro de 1966, o marechal Costa e Silva e
Pedro Aleixo foram eleitos presidente e vice-presidente da República, respectivamente.
Uma semana depois, em 13 de outubro, o Congresso Nacional recebeu o comunicado
sobre a cassação de seis deputados federais. O presidente da Câmara, Adauto
Lúcio Cardoso, a quem caberia receber as cassações, recusou-se a aceitar as
punições, presidindo as sessões legislativas com a participação dos seis
deputados em questão. Em 17 de outubro Moura Andrade declarou publicamente o
seu apoio à atitude de Adauto Cardoso. No dia 20 o Congresso foi tomado por
tropas militares e declarado em recesso compulsório até o dia 22 de novembro
seguinte.
De dezembro de 1966 a janeiro de 1967, período em que o
projeto de Constituição transitou no Congresso Nacional, foram propostas ao
original 1.800 emendas. A nova Carta foi promulgada em 24 de janeiro de 1967,
pelas mesas da Câmara e do Senado, dentro do prazo previsto. O projeto aprovado
não apresentava quase nenhuma mudança em relação ao projeto original enviado
para discussão. Também, o artigo 15 do AI-1 manteve-se intacto, tendo o
Congresso Nacional discutido a nova Constituição sob sua vigência.
Em fevereiro de 1967, Moura Andrade assumiu, pela sétima vez
consecutiva, a presidência do Senado Federal. Um mês depois, em 15 de março, o
senador, na qualidade de presidente do Congresso Nacional, presidiu a cerimônia
de posse do presidente e vice-presidente da República. Em seu discurso,
declarou-se disposto a se empenhar na tarefa de modernização do Congresso
Nacional e de construir os instrumentos necessários para que o Poder
Legislativo pudesse exercer as suas atribuições de forma mais eficiente.
Buscando concretizar os objetivos propostos, alguns dias depois, constituiu no
Senado um grupo de trabalho voltado para o estudo da reforma administrativa do
Poder Legislativo, do regimento do Senado, do regimento comum do Congresso
Nacional e para a elaboração do projeto de leis complementares.
Paralelamente,
o vice-presidente Pedro Aleixo, logo após sua posse, buscou promover um
redimensionamento político do seu cargo, reatribuindo-lhe as funções que lhe
eram devidas antes da instituição do regime parlamentarista. Com esse objetivo,
patrocinou a reforma do regimento comum do Congresso no sentido de transferir
para o vice-presidente da República a função de presidir as reuniões do
Congresso Nacional. Aconselhado pelo Ministro da Justiça, professor Luís Gama e
Silva, Moura Andrade recorreu ao Supremo Tribunal Federal, buscando sustar a
reforma em curso. A disputa entre ele e Pedro Aleixo se travou durante quatro
meses de intensos debates no Congresso até que, em 12 de agosto do mesmo ano, a
sua posição foi derrotada no Senado Federal. Com a aprovação da reforma do
regimento comum, a função de presidir o Congresso Nacional voltou ao
vice-presidente, cabendo ao presidente do Senado a tarefa de convocá-lo.
Em face dos transtornos políticos criados para o governo pela
atitude de Moura Andrade, disputando a presidência do Congresso Nacional,
tornou-se vitoriosa no interior do regime a posição de impedir a sua reeleição
pela oitava vez consecutiva ao cargo de presidente do Senado. Em 22 de
novembro, contudo, o senador decidiu candidatar-se novamente, mas em 22 de
fevereiro de 1968 foi derrotado pelo senador arenista Gilberto Marinho,
preferido do governo nas eleições para o cargo que ocupara durante sete anos
consecutivos.
Durante o período em que permaneceu na presidência do Senado,
além de organizar um completo e moderno serviço gráfico, fundou a Revista de
Informação Legislativa, publicação trimestral editada por aquela casa.
Em junho de 1968, embarcou para Madri, para assumir o posto
de embaixador do Brasil na capital espanhola. Permaneceu no cargo até 29 de
outubro de 1969, regressando em seguida ao Brasil.
Em novembro de 1969, depois de ter reassumido seu mandato de
senador, lançou-se mais uma vez à disputa pela presidência do Senado, tendo
sido derrotado pela segunda vez, em março de 1970, por João Cleofas, da Arena
de Pernambuco.
Encerrado seu mandato em 31 de janeiro de 1971, retirou-se da
vida pública, dedicando-se exclusivamente a atividades empresariais. Em 1980
foi nomeado pelo governador Paulo Salim Maluf presidente do Banco de
Desenvolvimento do Estado de São Paulo.
Foi diretor-presidente das Empresas Moura Andrade, voltadas
para as atividades pastoris e agrícolas, e do Frigorífico Mouran. Foi também
membro de honra da Faculdade de Filosofia Mater Verbi de São Paulo e membro do
Comitê de Honra do Patronato Assistencial dos Imigrantes Italianos.
Faleceu em São Paulo no dia 30 de maio de 1982.
Foi casado com Beatriz Estela Prado de Andrade, com quem teve
três filhos.
Publicou: Da prescrição aquisitiva, Embargos de terceiros
nas ações divisórias e Habeas-corpus e mandado de segurança, todos
ligados a questões de natureza jurídica.
FONTES: CAFÉ FILHO,
J. Sindicato; CISNEIROS, A. Parlamentares; COUTINHO, A. Brasil;
Digesto Econômico (4); ENTREV. BIOG.; Jornal do Comércio, Rio
(20/8/67); MACEDO, N. Aspectos; Maquis; MELO, L. Dic.; MIN.
REL. EXT. Almanaque (1971); REIS JÚNIOR, P. Presidentes; SENADO.
Dados; SILVA, H. 1964; VÍTOR, M. Cinco.