VALVERDE,
Belmiro
*mov. integralista; rev. 1938.
Belmiro de Lima Valverde
nasceu em Alagoinha (BA) no dia 22 de abril de 1884, filho de Antônio
Henrique de Lima Valverde e de Maria da Glória Pinto Valverde. Em sua família
destacou-se dom Miguel de Lima Valverde, arcebispo de Olinda e Recife de 1922 a
1951.
Diplomado
em 1906 pela Faculdade de Medicina da Bahia, Belmiro Valverde clinicou no alto
Amazonas e, posteriormente, no interior de São Paulo, transferindo-se depois
para o Rio de Janeiro, então Distrito Federal, onde aperfeiçoou seus
conhecimentos em clínica urológica. Premiado pela Academia Nacional de Medicina
em 1921, tornou-se depois um de seus membros e, durante vários anos, chefiou o
Serviço de Urologia da Policlínica do Rio de Janeiro. Foi, ainda, membro da
Academia Paulista de Medicina e da Société Belge d’Urologie.
Seu nome começou a aparecer no noticiário político nacional
em 1924, quando combateu o governo de Artur Bernardes, tendo por isso de
exilar-se na Europa. Em 1928-1929, já de volta ao país, participou do esquema
de segurança destinado a proteger Antônio de Siqueira Campos, exilado desde
1927 e então clandestinamente de visita ao Brasil. Em 1932, apoiou a Revolução
Constitucionalista.
Adesão ao integralismo
No início de 1933, Valverde aderiu à Ação Integralista
Brasileira (AIB), organização fundada em outubro do ano anterior por Plínio
Salgado. No mês de maio participou de um desfile de cerca de quatro mil
integralistas no Rio de Janeiro e, em setembro, de uma outra passeata que levou
perto de mil manifestantes às ruas de Niterói. Compareceu também ao
I Congresso da Província do Rio de Janeiro, realizado de 17 a 19 de
novembro de 1934, e ao I Congresso da Província da Guanabara, entre 4 e 12 de
julho do ano seguinte.
Chefe do departamento nacional de finanças da AIB entre março
de 1934 e junho de 1936, organizou diversas campanhas destinadas a angariar
fundos para a organização, tais como as da “Taxa do Sigma”, “Pelo bem do
Brasil” e “Campanha do ouro”. Esta última foi efetuada em todo o território
nacional durante o ano de 1936 e levantou recursos considerados à época
substanciais. Em junho desse ano, Valverde tornou-se membro do conselho supremo
da AIB. No mês de setembro quando da invasão da sede da AIB na Bahia, foi
detido no Rio e teve seu consultório revistado, sendo nele apreendidas armas e
munições. Após ser interrogado, foi posto em liberdade.
Em 1937, estando a AIB dividida, segundo Olbiano de Melo, em
três grupos — o dos burgueses, o dos antiimperialistas e o dos sindicalistas —,
Valverde ligou-se a este último, juntamente com os paulistas fundadores da
organização. Em 1º de novembro, participou da maior manifestação pública até
então realizada pelos integralistas no país, figurando entre os dez mil
“camisas-verdes” que, em passo militar, desfilaram pelas principais ruas do Rio
de Janeiro.
A conspiração de 1938
Após a decretação do Estado Novo em 10 de novembro de 1937 e
a extinção dos partidos políticos — inclusive a AIB — no dia 2 de dezembro
seguinte, os integralistas dividiram-se em duas tendências: uma de conciliação
e outra de oposição ao governo. Valverde pertencia a esta última, que passou a
conspirar visando à derrubada de Getúlio Vargas. No início de 1938 foi
procurado em sua residência por Olbiano de Melo e mais dois oficiais da Marinha
para ser informado da decisão, tomada pela oficialidade integralista, de
abandonar qualquer tentativa de composição com Vargas. Na ocasião, os oficiais
estavam dispostos a atacar o palácio Guanabara, residência oficial do
presidente da República.
Iniciada
a conspiração, ficou decidido que o comando dos integralistas no Rio de Janeiro
caberia a Belmiro Valverde. Quanto a Plínio Salgado, coordenaria, através de
emissários, os demais estados, articulando ainda outras forças políticas
não-integralistas, mas contrárias à ditadura. A Zona da Mata, em Minas Gerais,
ficaria sob responsabilidade militar de Olbiano de Melo, e a Plínio Salgado
caberia, como chefe supremo do movimento, determinar a data do levante em todo
o país. Essa data foi fixada em 11 de março de 1938. Nesse dia, um grupo de
milicianos chefiados por Jair Tavares e pelo tenente Francisco de Assis Holanda
Loiola aproximou-se da Rádio Mayrink Veiga, no Rio de Janeiro, com o objetivo
de tomá-la de assalto e daí transmitir a ordem do levante geral para todo o
interior do país. Como a polícia política já estivesse a par da conspiração, o
movimento foi esmagado antes mesmo de iniciar-se. Inúmeras prisões foram então
efetuadas e apreenderam-se armamentos e munições, além de mapas que indicavam a
distribuição de órgãos técnicos do governo. Devido ao malogro do levante,
Plínio Salgado refugiou-se em São Paulo.
A conspiração, entretanto, continuou. No Rio de Janeiro, o
planejamento e a coordenação material do movimento — incluindo a obtenção de
armas, a fabricação de explosivos e a arrecadação de fundos — ficaram sob
responsabilidade de Belmiro Valverde, que designou Severo Fournier, um jovem
oficial do Exército que participara do lado paulista da Revolução de 1932, para
a execução dessas tarefas. O plano estava articulado com o general reformado
João Cândido Pereira de Castro Júnior e com o grupo civil constituído por
Armando de Sales Oliveira, Júlio de Mesquita Filho, José Antônio Flores da
Cunha e Otávio Mangabeira, tendo como elemento de ligação José Paranhos do Rio
Branco.
Os objetivos do novo plano eram a tomada do palácio
Guanabara, a prisão dos ministros da Guerra e da Marinha, a ocupação da sede da
Polícia Civil e órgãos de direção e o controle de todos os meios de
comunicação, incluindo as ligações telefônicas e telegráficas. No dia 5 de
maio, em duas casas alugadas pelos conspiradores, realizou-se uma reunião
destinada a marcar a data do início do movimento, tendo seus participantes
insistido em que o ataque ao palácio fosse efetuado pelos “camisas-verdes”,
como o exigira Plínio Salgado numa reunião celebrada em sua residência no dia
21 de janeiro daquele ano.
Embora o tenente Fournier temesse precipitar a execução do
novo esquema revolucionário, acabou convencido por Valverde de que o movimento
deveria eclodir em 11 de maio. Nesse dia, estaria de guarda no palácio o
tenente integralista Júlio Nascimento, comandante do destacamento de fuzileiros
navais ali acantonado. Com a proximidade do dia aprazado, porém, as
contramarchas relativas à ação revolucionária já se faziam bastante acentuadas.
No
instante em que o tenente Fournier deixava a casa de nº 550 da avenida Niemeyer
— quartel-general da conspiração — para o assalto ao palácio, Valverde não
conseguiu esconder sua incerteza quanto ao êxito da operação. Além de haver
sugerido a Fournier que dispensasse os mais velhos, pois estes somente iriam
dar trabalho, Valverde o interpelou com a seguinte observação: “Você acha que
vai, Severo?” Dos quarenta e poucos homens que acompanharam o tenente Fournier,
nove foram dispensados em virtude de sua avançada idade.
O levante acabou sendo debelado em poucas horas, apesar da
debilidade da resistência legalista. Além do palácio Guanabara, foram atacadas
algumas residências de autoridades e o Ministério da Marinha. Apenas uma prisão
foi efetuada pelos integralistas, a do coronel Canrobert Pereira da Costa.
Embora Valverde não tivesse participado de nenhuma ação armada, com o fracasso
do movimento decidiu refugiar-se no interior do país. Sua casa foi revistada e
nela foi encontrada uma lista de nomes influentes de pessoas que deveriam ser
executadas, além do planejamento completo da ação armada. Preso pouco depois,
Valverde conseguiu fugir em 21 de setembro, sendo novamente detido em 14 de
outubro no bairro da Urca, na casa de seu companheiro de lutas João Daré.
Belmiro
Valverde foi condenado a 16 anos e meio de prisão pelo Tribunal de Segurança
Nacional, dos quais cumpriu apenas sete, parte na ilha de Fernando de Noronha e
parte na ilha Grande. Foi posto em liberdade em 19 de abril de 1945, quando da
decretação da anistia política no país, fato que antecedeu a queda de Vargas,
no dia 29 de outubro do mesmo ano.
Versões e acusações
Para
preservar a imagem de Plínio Salgado, os integralistas tentaram desvincular o
nome de seu líder do movimento fracassado, lançando toda a responsabilidade
pelo malogro do movimento principalmente sobre Valverde. Em entrevista
concedida a O Globo em 21 de maio de 1953, Plínio Salgado declarou que “o
movimento foi precipitado por culpa de Valverde, que desobedeceu à sua
orientação”. Esta teria sido a de que os chefes integralistas do Distrito
Federal “deveriam articular, preparar e aguardar, mas nunca decidir sobre a
forma de ação nem sobre a data de sua execução”.
Segundo
Valverde, o movimento fracassou “porque muitos dos que se haviam comprometido
falharam. Os oficiais comprometidos não compareceram aos seus postos de
combate; civis valentes quando das discussões e planejamento sumiram no momento
do perigo... os piquetes escalados para prender diversas personalidades nem
chegaram a sair de casa. Não pudemos contar com, no mínimo, 70% de nossas
forças”. Numa entrevista dada à imprensa algum tempo depois, Belmiro Valverde
admitiu ainda que, na época, até mesmo ele achou conveniente preservar a
mística do líder integralista, aceitando assim os argumentos de que teria
havido precipitação e assumindo o ônus da derrota.
Desde que foi libertado, Valverde não mais retornou às
atividades políticas, dedicando-se exclusivamente à medicina. Em 30 de março de
1963, entretanto, já muito doente, fechou seu consultório.
Faleceu no dia 21 de novembro de 1963.
Era casado com Maria da Glória Pinto Valverde, com quem teve
três filhos.
Publicou as seguintes obras: A lepra no Brasil (1921),
Aspectos da vida do Brasil; verdade, justiça, moral (1946), Arquivo dos
serviços de vias urinárias da Policlínica Geral do Rio de Janeiro (3v.).
Amélia Coutinho
FONTES: BROXSON, E.
Plínio; CARNEIRO, G. História; Grande encic. Delta; LEVINE, R. Vargas; MACEDO,
R. Efemérides; MELO, O. Marcha; NASSER, D. Revolução; SILVA, H. 1938; TAVARES,
J. Radicalização; TRINDADE, H. Integralismo.