MACIEL,
Antunes
*dep. fed. RS 1915-1917 e 1921-1923;
rev. 1923; dep. fed. RS 1924-1927 e 1930; rev. 1930; min. Just. 1932-1934.
Francisco Antunes Maciel Júnior era natural de Pelotas (RS). Segundo seus familiares, nasceu
no dia 4 de maio de 1881, mas outras fontes indicam o ano de 1879. Filho de
Francisco Antunes Maciel e Francisca de Castro Moreira Maciel, e neto, por
parte de mãe, do barão de Butuí, entrou desde cedo em contato com a política, à
qual sua família estava tradicionalmente ligada. Seu pai, filiado ao Partido
Liberal e durante muitos anos auxiliar de Gaspar Silveira Martins, foi
deputado-geral de 1881 a 1889, ministro do Império em 1883 e um dos chefes do
Partido Federalista no Rio Grande do Sul depois da proclamação da República.
Participou da Revolução Federalista que entre 1893 e 1895 conflagrou os estados
do Sul e terminou com a vitória dos republicanos, o que lhe valeu o exílio no
Uruguai, e foi ainda deputado federal de 1906 a 1911. Seu irmão, Artur Antunes
Maciel, foi interventor em Mato Grosso entre 1931 e 1932.
Antunes Maciel Júnior iniciou seus estudos ainda em Pelotas.
Com a mudança forçada de sua família para Montevidéu, passou a freqüentar o
curso secundário em uma escola anexa à universidade da capital uruguaia. Em
1896, após o término da Revolução Federalista, regressou à sua cidade natal e
no ano seguinte transferiu-se para São Paulo, onde concluiu os cursos
preparatórios e ingressou em 1899 na Faculdade de Direito. Depois de freqüentar
essa escola durante três anos, teve de se mudar para o Rio de Janeiro (então
Distrito Federal), onde bacharelou-se em 1902. Ainda acadêmico, colaborou com
vários jornais do Rio Grande do Sul.
Formado,
advogou em Pelotas até 1906, quando foi convidado para dirigir o jornal
A Reforma, órgão do Partido Federalista. Fundado durante o Império por
Silveira Martins como órgão do Partido Liberal, A Reforma atuou durante toda a
República Velha como instrumento de divulgação das teses parlamentaristas e
unitaristas do partido. Antunes Maciel dirigiu o jornal durante seis anos,
residindo os dois últimos em Porto Alegre.
Em 1912, abandonou o cargo e publicou o livro O Rio Grande:
anotações esparsas, onde criticava a situação do estado, principalmente o
sistema de governo dos republicanos, que se encontravam no poder desde 1892. Em
1914, defendeu tese de livre-docência na Faculdade de Direito de São Paulo com
a dissertação Síntese da evolução do equilíbrio político, mas não foi aprovado.
No
pleito de janeiro de 1915, elegeu-se deputado federal pelo Rio Grande do Sul,
na legenda do Partido Federalista, com 18.510 votos, concorrendo em acirrada
disputa contra uma chapa completa do partido da situação.
No início de seu mandato, participou de diversas comissões de
inquérito para o reconhecimento de novos deputados. Após três meses de
trabalhos, apenas três candidatos “independentes” foram reconhecidos, entre
eles o próprio Antunes Maciel. Sua intensa participação na Câmara surpreendeu a
grande maioria dos parlamentares, que esperava apenas uma atuação discreta de
um iniciante na carreira política. Mesmo assim, não conseguiu ter seu mandato
renovado no pleito seguinte, e se dedicou ao jornalismo, sustentando na
imprensa gaúcha sua posição contrária à situação estadual.
Em 1921, tornou a se candidatar a deputado federal pelo
Partido Federalista. Eleito, integrou na Câmara a Comissão de Finanças,
presidida por Antônio Carlos Ribeiro de Andrada. Ainda nesse ano, em outubro, o
Correio da Manhã do Rio de Janeiro publicou uma série de cartas atribuídas a
Artur Bernardes, candidato à presidência da República, contendo ofensas às
forças armadas.
Partidário de Bernardes, que já apoiara em 1917 nas eleições
para a presidência de Minas Gerais, Antunes Maciel assumiu sua defesa na
Câmara, batendo-se para que o Congresso exigisse do jornal carioca explicações
sobre a origem dos documentos. Sindicância posterior concluiu que haviam sido
forjados — o que fez com que ficassem conhecidos como as “cartas falsas” — mas
sua publicação acirrou a oposição dos militares a Bernardes, o qual, não
obstante, elegeu-se em março de 1922.
A Revolução de 1923
Em
janeiro de 1923, encerrou-se no Rio Grande do Sul a apuração das eleições de
novembro do ano anterior. Pela quinta vez, Antônio Augusto Borges de Medeiros,
líder do Partido Republicano Rio-Grandense (PRR), conquistou a presidência do
estado, derrotando Joaquim Francisco de Assis Brasil. Este e seus partidários,
na maioria antigos federalistas, rebelaram-se contra o governo estadual,
convencidos de que houvera fraude nas eleições. No dia da posse do presidente
eleito (25 de janeiro), uma série de levantes em diversos pontos do estado deu
início a um movimento armado que duraria cerca de dez meses.
Antunes
Maciel viajou para o Sul no início de fevereiro, a fim de aderir aos
revoltosos. No mês seguinte, em telegrama ao presidente da República,
comunicava sua adesão à coluna revolucionária de Filipe Portinho, caudilho da
região serrana do estado. Borges de Medeiros declarou mais tarde a João Luís
Alves (ministro da Justiça de 1922 a 1925) que Antunes Maciel, antes de
integrar-se à luta, propôs-lhe um acordo em que previa a realização de nova
eleição para a vice-presidência do estado, o impedimento de nova reeleição do
presidente e a ampliação das atribuições da Assembléia estadual. Borges,
contudo, recusou a proposta.
Com o estabelecimento do armistício no princípio de novembro
de 1923, Assis Brasil e Antunes Maciel — a essa altura membro do estado-maior
revolucionário — mantiveram intensos contatos com o ministro da Guerra, o
general Fernando Setembrino de Carvalho, que se encontrava no Rio Grande do Sul
para obter a pacificação do estado. Nessa ocasião, Assis Brasil, certo do êxito
de sua facção, impôs como condição básica para o acordo a realização de novas
eleições no estado, sem o que nem ele nem Maciel acreditavam em solução
duradoura para o conflito.
Antunes
Maciel, entretanto, discordava de Assis Brasil quanto às possibilidades de
vitória militar: em seu contato direto com a frente de combate, tomara ciência
de que o movimento não contava com recursos para se sustentar por muito mais
tempo. Assim, no dia 10 de novembro, Maciel enviou a Setembrino telegrama no
qual reconhecia não ser possível o afastamento imediato de Borges, razão pela
qual os revolucionários deveriam aceitar a alternativa apresentada pelo governo
federal, no sentido de suprimir progressivamente o sistema implantado pelos
republicanos. Propunha ainda uma alternativa em caso de impasse: o julgamento
da questão por um tribunal composto de três árbitros, um para cada parte e o
terceiro representando o governo federal. Sugeria, finalmente, o adiamento das
eleições estaduais marcadas para o início de 1924.
Nos primeiros dias de dezembro, as negociações chegaram a um
novo impasse. O general Setembrino apelou diretamente para Antunes Maciel, que
muito contribuiu para afastar os obstáculos. Segundo Hélio Silva, sua
intervenção foi decisiva para que Assis Brasil aceitasse a nova proposta do
governo federal, da qual resultou o Pacto de Pedras Altas, assinado em 15 de
dezembro de 1923. De todas as exigências dos libertadores, apenas a deposição
imediata de Borges não foi aceita, vedando-se sua reeleição para a presidência
do estado e sendo-lhe retirado o poder de nomear seu vice-presidente.
Em 1924, Antunes Maciel foi novamente eleito deputado
federal, dessa vez na legenda da Aliança Libertadora, agremiação que havia
aglutinado os antigos federalistas e dissidentes republicanos. Ao final do
mandato (1927), retornou a Pelotas, onde assumiu a direção de O Libertador,
porta-voz de sua agremiação.
Entre
3 e 5 de março de 1928, participou, em Bajé (RS), de um congresso que tinha por
finalidade transformar a Aliança Libertadora em um partido que reunisse todas
as forças de oposição do estado. Dessa reunião resultou a criação do Partido
Libertador (PL), no qual ingressaram também os antigos federalistas.
A Aliança Liberal e a Revolução de 1930
Em junho de 1929, tendo em vista a disputa da sucessão do
presidente da República, Washington Luís, representantes dos estados de Minas
Gerais e do Rio Grande do Sul, reunidos por iniciativa de João Neves da
Fontoura, líder da bancada gaúcha na Câmara, firmaram secretamente no Rio de
Janeiro o Pacto do Hotel Glória. Segundo o documento, primeiro passo para a
formação da Aliança Liberal, ficaram acertados o veto de Minas ao situacionista
Júlio Prestes e a retirada da candidatura do então presidente mineiro Antônio
Carlos Ribeiro de Andrada, bem como o apoio ao lançamento de um candidato
gaúcho: Borges de Medeiros ou o então presidente do Rio Grande do Sul, Getúlio
Vargas.
No dia 22 de julho, Antunes Maciel, em carta a Assis Brasil,
informou que já vinha fazendo, de modo indireto, propaganda da Aliança Liberal
em O Libertador, embora ainda aguardasse a definição oficial do PL. No mesmo
dia, recebeu um telegrama de Osvaldo Aranha, republicano e então secretário do
Interior do Rio Grande do Sul, pedindo que comparecesse a Porto Alegre.
Em 25 de julho Antunes chegou à capital gaúcha, onde manteve
um encontro com Getúlio Vargas. O presidente gaúcho revelou-lhe a existência do
Pacto do Hotel Glória, e afirmou que só aceitaria candidatar-se caso o PL se
unisse ao PRR para lhe dar apoio, o que garantiria a unidade política do
estado. Pedindo a Antunes Maciel que servisse de intermediário junto a Assis
Brasil, solicitou-lhe também que anunciasse as condições do PL para formar a
frente com o outro partido gaúcho.
Após
algumas reuniões e trocas de telegramas, Vargas obteve em 27 de julho a palavra
final de Assis Brasil quanto à sua indicação: era favorável, mas só tornaria
esse apoio oficial após a reunião do diretório central do PL. Concluída a 1º de
agosto, essa reunião — a que estiveram presentes, entre outros, o próprio Assis
Brasil, Antunes Maciel, João Batista Luzardo, Raul Pilla e um emissário de
Getúlio — ratificou o apoio do partido à candidatura de Vargas, cabendo a
Antunes Maciel a tarefa de comunicar seu resultado ao presidente gaúcho.
Formou-se
então a Frente Única Gaúcha (FUG), reunindo o PL e o PRR. Antunes Maciel passou
a integrar o comitê da Aliança Liberal em Pelotas, desenvolvendo intenso
trabalho de arregimentação em torno da chapa Getúlio Vargas-João Pessoa também
nos municípios vizinhos. Desse modo manteve estreito contato com o candidato
gaúcho, e já em dezembro de 1929 anunciou a Vargas que havia em Pelotas grande
desânimo, provocado por sua desistência da viagem ao Norte e pela saída de
Firmino Paim Filho da Secretaria da Fazenda do Rio Grande do Sul (após deixar o
cargo, Paim viajara para a capital federal, ensejando especulações em torno de
um possível acordo entre Vargas e Washington Luís).
No início de 1930, Antunes Maciel intensificou as atividades
de coordenação da campanha aliancista em Pelotas, ao mesmo tempo em que
realizava sua própria campanha eleitoral para a Câmara. Nas eleições de 1º de
março, enquanto era eleito deputado federal, o candidato situacionista Júlio
Prestes foi sufragado presidente da República.
Com a derrota nas urnas da Aliança Liberal, surgiu uma
divergência entre seus integrantes: enquanto o grupo de João Neves da Fontoura
defendia a organização de um movimento armado, outros aliancistas deram por
encerrada a tarefa da coalizão. Nessa ocasião, Antunes Maciel afirmou a João Neves
que era necessário dar-se continuidade à FUG, pois caso contrário todo o
esforço despendido até então teria sido inútil. Reiterando essa posição em
editorial de O Libertador, Maciel enviou na mesma época uma carta a Osvaldo
Aranha em que confirmava estar o PL disposto a prosseguir na campanha até a
revolução.
Às vésperas da partida de Maciel para o Rio, onde tomaria
posse na Câmara, Assis Brasil enviou-lhe um memorando em que estava delineada a
atuação que a bancada do PL deveria ter no Congresso. O PL não reconheceria a
autoridade de um presidente eleito pela fraude ou pela violência, posição que
deveria ser mantida até que o conselho supremo da Aliança Liberal proclamasse a
eleição do seu candidato — que assumiria a presidência da República no Rio Grande
do Sul — e exigisse a saída de Júlio Prestes.
Antunes Maciel assumiu sua cadeira na Câmara em 3 de maio de
1930, e participou da luta parlamentar, liderada por João Neves, contra o
não-reconhecimento de deputados aliancistas eleitos pela Paraíba e por Minas
Gerais. Por outro lado, a partir de julho, quando foi assassinado João Pessoa,
que concorrera à vice-presidência da República pela Aliança Liberal,
intensificaram-se os preparativos revolucionários, embora Vargas se mantivesse
em princípio hesitante quanto ao recurso à luta armada.
No princípio de agosto, Antunes Maciel foi credenciado por
Osvaldo Aranha e Getúlio Vargas junto a Lindolfo Collor — líder da bancada do
PRR na Câmara —, para refazer as articulações revolucionárias no Rio e em São
Paulo, abandonadas desde o último adiamento da data da eclosão do movimento.
Levando plenos poderes e instruções detalhadas, Maciel entrou em contato com
conspiradores paulistas, cariocas, mineiros e gaúchos, como Francisco Morato,
Valdomiro Magalhães, Pedro Ernesto Batista, Mário Brant, Leopoldo Néri da
Fonseca, Eduardo Gomes, Ildefonso Simões Lopes e Plínio Casado. Durante sua
missão, manteve-se em contato permanente com Osvaldo Aranha, que centralizava a
organização do movimento.
Finalmente, a revolução eclodiu em Porto Alegre na tarde do
dia 3 de outubro. Antunes Maciel juntou-se a um contingente da Guarda Civil, e
participou pessoalmente do ataque ao Arsenal de Guerra. Após a forte
resistência inicial da guarnição, chegaram os reforços enviados por José Antônio
Flores da Cunha e os revolucionários, forçando o portão de entrada, obtiveram a
rendição da unidade.
Consolidada a situação militar no Rio Grande, as forças
revolucionárias iniciaram sua marcha para o norte. No dia 12 de outubro,
Getúlio Vargas resolveu partir de Porto Alegre e assumir pessoalmente o comando
do movimento. Antunes Maciel acompanhou-o, integrando seu estado-maior civil
durante a permanência do comando da revolução no Paraná. Em 24 de outubro,
elementos da cúpula militar depuseram Washington Luís, assumindo o governo uma
junta governativa provisória formada por oficiais-generais das forças armadas.
Getúlio Vargas partiu então do Paraná, chegando ao Rio no dia 31 de outubro e
assumindo o poder no dia 3 de novembro, na qualidade de chefe do Governo
Provisório da República.
Secretário da Fazenda do Rio Grande do Sul
Com a vitória da revolução, Flores da Cunha foi nomeado
interventor federal no Rio Grande do Sul, e por sua vez designou Antunes Maciel
para ocupar o cargo de secretário da Fazenda. O estado atravessava uma séria
crise financeira, e já em dezembro Maciel enviava carta a João Neves, então
assessor jurídico do Banco do Brasil, expondo a situação e pedindo sua
interferência para a obtenção de recursos federais. A dificuldade do estado em
saldar suas dívidas internas e externas e a insolvência do Banco do Estado,
além da falta de recursos para o pagamento do funcionalismo civil e da Brigada
Militar, também foram abordadas em nova carta, que Maciel enviou a Vargas no
início de 1931.
Embora confirmasse o auxílio federal, o chefe do Governo
Provisório respondeu-lhe lembrando que a crise afetava todo o país, o que
recomendava a adoção de severas medidas de contenção econômica.
Na
mesma época, o Banco Pelotense — que desempenhara importante papel na expansão
da economia gaúcha nos anos anteriores — viu-se em uma situação financeira
precária. Antunes Maciel tornou a pedir auxílio a diversos conterrâneos bem
situados na administração federal, mas não conseguiu sensibilizá-los. Tentou
ainda obter um empréstimo no Banco do Brasil, que o Tesouro do estado se
encarregaria de empregar no saneamento financeiro do banco.
Também essa ajuda lhe foi negada, e o estado se viu na
contingência de solicitar a liquidação do Banco Pelotense, a partir do que a
Secretaria da Fazenda do estado estudaria a encampação de seu acervo pelo Banco
do Estado do Rio Grande do Sul. Segundo Artur Ferreira Filho, essa medida
possibilitou uma recuperação mais rápida das finanças estaduais, uma vez que o
governo gaúcho entrou na posse de um grande patrimônio em imóveis e contas a
receber, propondo-se a pagar seus credores com apólices a longo prazo.
No
início de 1932, intensificaram-se as pressões exercidas por São Paulo e pelo
Rio Grande do Sul em favor da constitucionalização do país, opondo-se à
manutenção do estado de exceção defendida pelos revolucionários mais radicais.
Em 24 de fevereiro, Vargas assinou a nova lei eleitoral, uma das exigências da
FUG. No dia seguinte, foi empastelado o Diário Carioca, órgão de oposição ao
tenentismo e que muito lutara por essa lei. Ante a relutância do governo em
apurar as responsabilidades, no dia 29 o ministro da Justiça, Maurício Cardoso
(ligado à FUG), pediu demissão, sendo acompanhado nessa atitude por vários
outros gaúchos que integravam a administração federal.
Em
março, agravou-se a situação política do Rio Grande, onde a liderança da FUG se
aproximava cada vez mais dos paulistas. No final do mês, Antunes Maciel — que
já se encontrava na verdade afastado do PL — escreveu a Assis Brasil afirmando
que se manteria ao lado de Vargas. Negando que o atentado ao Diário Carioca
houvesse sido o real motivo da demissão dos gaúchos, criticava o PL por se
aproximar dos paulistas, antigos aliados de Washington Luís.
Durante
toda a crise, Maciel sustentou essa posição. No dia 12 de maio, o Diário de
Notícias de Porto Alegre noticiou sua intenção de afastar-se da Secretaria da
Fazenda, já que sua nomeação fora vinculada à representação do PL no governo. O
próprio Antunes Maciel confirmou a notícia, em carta à direção do jornal em que
afirmava também aguardar apenas a concordância de Flores da Cunha para deixar a
cargo. O diretório central do PL decidiu então expulsá-lo do partido em junho,
mas Flores, embora Antunes insistisse na exoneração, decidiu preservá-lo em seu
secretariado, interessado em manter abertas as possibilidades tanto de aliar-se
à FUG quanto de conservar-se fiel ao governo federal no desdobramento da crise
política.
Em julho de 1932, a tensão crescente acabou redundando na
eclosão da Revolução Constitucionalista em São Paulo, dirigida pela Frente
Única Paulista (FUP). Flores da Cunha decidiu-se finalmente pelo apoio a
Getúlio, enquanto a FUG, embora envolvida na articulação do movimento, não
chegou a ter participação decisiva no conflito. Em outubro, foi assinado o
armistício que selava a derrota dos paulistas, e o fim da conflagração
encontrou ainda mais aprofundadas as divergências na política interna gaúcha.
Embora tivesse derrotado os paulistas, o Governo Provisório
decidiu empenhar-se no processo de constitucionalização do país, convocando
eleições para uma assembléia constituinte que deveria reunir-se no final de
1933. Aos interventores coube a tarefa de fundar partidos políticos para
concorrer a esse pleito.
No
Rio Grande do Sul, Flores da Cunha encarregou Antunes Maciel de viajar pelo
interior do estado, fazendo contatos para reforçar a articulação do partido
situacionista gaúcho. De volta de sua excursão, Antunes apresentou um extenso
relatório ao interventor, e integrou a comissão formada para elaborar o
programa da nova agremiação, o Partido Republicano Liberal (PRL). Nessa
comissão, cabia-lhe fazer com que os princípios fundamentais do partido
coincidissem com a orientação traçada por Osvaldo Aranha, que juntamente com
Vargas havia planejado a reorganização política do Rio Grande do Sul.
No Ministério da Justiça
Para
fortalecer os laços entre o governo federal e as forças políticas gaúchas
comprometidas com o Executivo, Antunes Maciel foi nomeado no dia 1º de novembro
de 1932 para o Ministério da Justiça do Governo Provisório, pasta que vinha
sendo ocupada interinamente há sete meses, primeiro por Francisco Campos e mais
tarde por Afrânio de Melo Franco. No mesmo dia 1º, o Governo Provisório promulgou
o Decreto nº 22.040, convocando a Comissão Constitucional, encarregada de
elaborar o anteprojeto de constituição. Empossado no ministério em 7 de
novembro, Antunes Maciel deu continuidade ao encaminhamento do processo de
constitucionalização, formando a subcomissão conhecida como Comissão do
Itamarati, presidida por Afrânio de Melo Franco, para iniciar a preparação do
anteprojeto.
Com a constitucionalização, o Governo Provisório não se
limitava a atender à expectativa criada pela Revolução de 1932, mas procurava
também absorver novas forças e institucionalizar o conflito político,
canalizando-o através da Assembléia Nacional Constituinte. Coube a Getúlio
Vargas e a Antunes Maciel todo o encaminhamento legal do processo, desde a
regulamentação do Código Eleitoral até a elaboração do próprio regimento
interno da Assembléia. Foi o ministro da Justiça que conseguiu, por exemplo,
introduzir na Constituinte a representação profissional, que vinha sendo
refutada em vários setores.
Durante todo esse período, Antunes Maciel atuou como assessor
e porta-voz de Vargas, tendo a seu cargo a coordenação geral do processo de
constitucionalização. Coube-lhe assim, no período imediatamente anterior às
eleições, dar auxílio ao chefe do governo na tarefa de garantir a vitória das
forças que o apoiavam, razão pela qual procuraram fortalecer a posição dos
interventores nos estados.
No caso do Rio Grande do Sul, a presença de Antunes Maciel no
ministério significava para Flores da Cunha um aliado poderoso, um observador
que acompanhava as articulações nos bastidores e fornecia uma visão realista e
bem informada da situação política.
Inicialmente, o novo ministro da Justiça constituiu-se num
forte ponto de apoio para o o interventor gaúcho, permitindo-lhe neutralizar os
esforços da oposição. Por intermédio de Antunes Maciel, Flores recebeu do
governo federal a autorização para manter mobilizados dez corpos provisórios —
forças militares de sua confiança — e com isso impedir a irrupção de um
movimento que se preparava e já contava com o apoio de setores civis e
militares contrários ao Governo Provisório.
O interventor conseguiu também assegurar o domínio de seu
partido, obtendo do Ministério da Justiça que só aceitasse o registro do
Partido Republicano Rio-Grandense, componente da FUG, no dia 16 de abril de
1933, isto é, às vésperas do pleito de 3 de maio. Em seguida, impugnou a chapa
da FUG por meio da cassação de alguns dos seus componentes, obrigando a
oposição a apresentar candidatos improvisados às eleições.
Desse modo, nos primeiros meses de sua gestão Antunes Maciel
atuou mais no auxílio à campanha do PRL no Rio Grande do Sul do que como
intermediário para a intervenção de Flores da Cunha na política nacional, papel
que assumiu somente após as eleições, nas quais o PRL fez 13 deputados, contra
três eleitos pela oposição.
Em
setembro de 1933, dois meses antes da instalação da Constituinte, a morte do
presidente mineiro Olegário Maciel desencadeou a disputa entre Virgílio de Melo
Franco e Gustavo Capanema pelo cargo de interventor federal em Minas. Virgílio
era apoiado principalmente por Osvaldo Aranha, então ministro da Fazenda,
enquanto a candidatura de Capanema era defendida por Flores da Cunha. Devido à
ausência de Vargas, que se encontrava em viagem pelo Norte-Nordeste, Antunes Maciel
foi autorizado pelo chefe do Governo Provisório a iniciar as negociações. No
entanto, para solucionar o chamado “caso mineiro”, Getúlio não poderia preterir
nenhuma das facções, já que isso resultaria na perda do apoio de uma delas na
Constituinte. Assim, ao retornar, Vargas preferiu articular a indicação de um
tertius, escolhendo Benedito Valadares, então obscuro deputado federal mineiro.
Há versões segundo as quais Osvaldo Aranha teria considerado
que Antunes Maciel foi o responsável por Vargas ter abandonado a indicação de
Virgílio de Melo Franco (cujo decreto de nomeação esteve para ser assinado pelo
chefe do governo). Assim, a perda da influência de Aranha na condução política
do país seria decorrente do crescimento do prestígio de Antunes Maciel
(enquanto representante de Flores) na pasta da Justiça.
Os trabalhos da Constituinte
Desde
o início dos debates na Assembléia Nacional Constituinte, instalada em novembro
de 1933, foram grandes as dificuldades encontradas pelos coordenadores dos
trabalhos para obter consenso em torno da orientação governamental. Isso exigia
um crescente entrosamento entre membros do governo e chefes políticos com
autoridade para determinar às bancadas alinhadas a posição a ser adotada. Nessa
situação, o apoio mais próximo de Vargas era o do novo situacionismo gaúcho, o
que realçou a função de intermediário entre Flores e Vargas desempenhada por
Antunes Maciel.
No entanto, com a intensificação do processo político, que
instabilizou as relações entre o Governo Provisório e a Constituinte, Flores da
Cunha viu reduzida sua capacidade de formular a orientação da bancada do PRL.
Assim, Antunes Maciel, engajado nas articulações diárias com representantes de
outras forças políticas, acabou por se emancipar de sua condição inicial de
assessor e delegado do interventor gaúcho, passando a exercer, com relativa
autonomia, a representação do compromisso deste com Vargas, e de ambos com a
coordenação e a maioria da Constituinte.
No dia 4 de abril de 1934, Antunes Maciel declarou a O Estado
de S. Paulo que preferia eleições indiretas para a presidência da República,
pois a adoção do pleito direto seria “pelo menos um passo para o retorno ao
passado”. Propunha a formação de um colégio eleitoral “numeroso e de muita
expressão”, formado a partir de três tipos de representação — popular, estadual
e profissional —, e afirmava que Vargas não estava buscando a eleição, embora
não pudesse recusá-la.
Três dias depois, O Globo publicava as “possíveis
modificações” que, segundo Maciel, o texto aprovado na primeira discussão na
Constituinte ainda deveria sofrer. Além da composição do colégio eleitoral,
defendia um Legislativo unicameral, com a supressão do Senado e sua
substituição por um Conselho Federal “sem funções legislativas, salvo em casos
especiais”, e a manutenção da representação profissional. Além disso, embora
fosse mantido o presidencialismo, os ministros ficariam comprometidos a
comparecer à Câmara, para prestação de contas.
Ainda em abril, Maciel intercedeu junto a Flores da Cunha em
defesa das eleições indiretas para a presidência da República, o que foi
acatado pelo interventor gaúcho, que por sua vez telegrafou ao líder da bancada
do PRL, Augusto Simões Lopes, defendendo esse princípio. A apresentação das
emendas gaúchas, contudo, provocou violenta reação nas bancadas de São Paulo e
Minas Gerais, que logo promoveram reuniões de coordenação entre as grandes
bancadas a fim de elaborar emendas em conjunto a partir de um acordo em torno
dos pontos consensuais.
Fiel à orientação de Flores da Cunha e de Antunes Maciel,
Augusto Simões Lopes ainda tentou apresentar fórmulas intermediárias, mas não
conseguiu suplantar a intransigência das bancadas mineira e paulista. Desse
modo, os gaúchos tiveram que abandonar a posição do governo, ficando decidido
que a Constituição instituiria o pleito direto para a presidência. No entanto,
para o mandato presidencial que se seguiria, as disposições transitórias da
nova Constituição fixaram a eleição indireta.
Em
maio, agravou-se a crise política na Assembléia, já que se aproximavam as
eleições presidenciais e entrava em votação o capítulo das “Disposições
transitórias”, relativas à aprovação dos atos do Governo Provisório, à
elegibilidade dos interventores e à resolução sobre a transformação ou não da
Constituinte em Câmara ordinária. Para Vargas, era necessário garantir sua
eleição, para o que lançou mão de todos os recursos políticos de que dispunha.
Nesse sentido, o ministro da Justiça elaborou os decretos nº
24.297, de 28 de maio de 1934, concedendo anistia aos envolvidos no movimento
de 1932, e nº 24.776, de 14 de julho, suspendendo a censura à imprensa. As duas
medidas, há muito reivindicadas por parte da oposição, foram concedidas às
vésperas do pleito. No entanto, não foram suficientes para assegurar uma vitória
eleitoral, e Antunes Maciel se viu obrigado a desenvolver pessoalmente um
cuidadoso trabalho de “boca de urna” junto aos líderes das bancadas.
Da eleição de Vargas ao Estado Novo
Embora
a oposição se apresentasse dividida, o processo eleitoral foi difícil, tendo
exigido grande habilidade de Maciel tanto na esfera da Assembléia quanto nos
meios militares, onde estava em curso uma conspiração que constituía uma ameaça
considerável. Finalmente, Vargas foi eleito presidente constitucional da
República em 17 de julho de 1934, um dia depois de promulgada a nova
Constituição.
Segundo Maria Helena de Magalhães Castro, Antunes Maciel
ocupou, durante esse período, uma posição “incômoda, comprometido como estava
com as orientações nem sempre concordantes de Vargas e Flores da Cunha. Por
outro lado, as funções de seu cargo colocavam-no na situação ambígua de
promotor da abertura política e representante da ditadura, responsável direto,
por exemplo, pela censura. Isso lhe valeu tanto a crítica constante da minoria
opositora como eventuais pressões de setores governamentais, insatisfeitos com
o encaminhamento da constitucionalização. Mas as dificuldades maiores surgiram
em seu relacionamento com Flores da Cunha, que muito resistiu em abrir mão da
participação direta nos processos decisórios.
Antunes Maciel permaneceu até o dia 24 de julho de 1934 à
frente do Ministério da Justiça, reestruturado em função da
reconstitucionalização do país. Foi substituído no cargo por Vicente Rao, e em
seguida foi nomeado diretor da Carteira de Redescontos do Banco do Brasil.
Ainda assim, continuava a manter Flores informado dos acontecimentos políticos
da capital, chegando a ser considerado por Vargas “delegado político” e
“executor das manobras” do interventor gaúcho.
Em 1935, Flores da Cunha, eleito governador do Rio Grande do
Sul (15/4/1935), envolveu-se na campanha pela sucessão governamental no estado
do Rio, precipitando, em conseqüência, seu rompimento com Vargas. Antunes
Maciel e o deputado gaúcho João Carlos Machado esforçaram-se em vão para evitar
a ruptura, e no final do ano Flores recusou a oferta feita por Vargas de
entregar a um gaúcho a liderança da maioria na Câmara.
No início de 1936, a continuação das prisões de suspeitos de
envolvimento na Revolta Comunista de 1935 e das violências policiais praticadas
contra eles provocou forte reação no Congresso, onde senadores e deputados da
minoria iniciaram um movimento em favor dos presos políticos. Em 21 de março, o
estado de sítio vigente desde o levante foi transformado em estado de guerra.
Em conseqüência, foram suspensas as imunidades parlamentares, e no dia 26 cinco
congressistas defensores dos direitos dos presos foram encarcerados sob a
acusação de estarem organizando um novo movimento subversivo.
Já nos primeiros dias de abril, Flores da Cunha convocou uma
reunião das bancadas gaúchas na Câmara e no Senado, à qual compareceram também
Antunes Maciel e o ministro da Fazenda, Artur de Sousa Costa. No fim do
encontro, foi divulgada à imprensa uma nota reafirmando o apoio político gaúcho
ao governo federal, especialmente na repressão ao comunismo e no fortalecimento
do poder civil. O documento ressalvava, porém, a salvaguarda das imunidades
parlamentares.
Em 1937, a questão da sucessão presidencial catalisou todas
as discussões, alianças e rupturas políticas. A transferência do poder de
execução do estado de guerra no Rio Grande do Sul para o comandante da 3ª
Região Militar e a definição do apoio de Flores da Cunha à candidatura de
Armando de Sales Oliveira aprofundaram consideravelmente a divergência entre o
governador gaúcho e Vargas. Por outro lado, a crise foi sensivelmente agravada
pelo rompimento entre Flores e a FUG, consumado em abril desse ano.
No
dia 27 desse mês, em carta dirigida ao chefe do governo, Antunes Maciel pediu
demissão do cargo que ocupava no Banco do Brasil, e ao justificar esse ato
fazia previsões — que posteriormente viriam a ser confirmadas — acerca de um
golpe de Estado que estava sendo preparado, com o qual não poderia ser
solidário em vista de seu passado de político liberal.
Em
seguida, a crise atingiu seu clímax em outubro, quando Flores apresentou, no
dia 17, seu pedido de renúncia, exilando-se em seguida no Uruguai. Na sessão do
dia seguinte da Assembléia Legislativa, a maioria decidiu apresentar o nome de
Antunes Maciel para substituí-lo.
Segundo informação de Maurício Cardoso a João Neves, Flores
só teria concordado em renunciar ao obter de 20 deputados o compromisso de que
votariam em Antunes Maciel. Benjamim Vargas chegou a apelar para seu irmão Getúlio
para que decretasse a intervenção federal no estado, a fim de impedir a eleição
de seu ex-ministro da Justiça. Embora respondesse inicialmente que preferia
estudar mais o caso e que a eleição de Antunes não impediria uma futura
intervenção no estado, Vargas acabou por decretá-la dois dias após a renúncia
de Flores.
Afastado da política
Com a instauração do Estado Novo (10/11/1937), Antunes Maciel
retirou-se da vida pública, não tendo aceito qualquer cargo até 1945. No
governo do general Eurico Dutra (1946-1951), foi nomeado membro do conselho
técnico do Instituto de Resseguros do Brasil e, a partir de junho de 1950,
assumiu a presidência do Instituto Nacional do Sal. Ocupou esse cargo até
fevereiro de 1951, quando o colocou à disposição do novo presidente da
República, Getúlio Vargas, que tomara posse no dia 31 de janeiro.
Em julho de 1953, assumiu o cargo de diretor do Banco
Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDE), cargo em que permaneceu até
agosto de 1960. Em junho de 1958, quando Lucas Lopes deixou a presidência do
BNDE, substituiu-o em caráter interino até agosto do mesmo ano, quando Roberto
Campos assumiu o cargo. Em diversas ocasiões, integrou interinamente o conselho
de administração do BNDE.
Após deixar o banco, presidiu a Termoelétrica Charqueadas, em
seu estado natal. Na mesma época, publicou diversos artigos no Correio do Povo
de Porto Alegre.
Faleceu em 1º de novembro de 1966, no Rio de Janeiro.
Foi casado com Emília Antunes Maciel, com quem teve três
filhas.
Seu arquivo pessoal encontra-se depositado no Centro de
Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil (Cpdoc) da Fundação
Getulio Vargas, no Rio de Janeiro.
Regina da Luz Moreira
FONTES: ABRANCHES,
J. Governos (2); ARQ. ANTUNES MACIEL; ARQ. NAC. Relação; BOMENY, H. Estratégia;
CASTRO, M. Rio; CORRESP. BANCO NAC. DESENV. ECON.; DULLES, J. Getúlio; Encic.
Mirador; ENTREV. PEIXOTO, A.; FERREIRA FILHO, A. História; FONTOURA, J.
Memórias; FUND. GETULIO VARGAS. Cronologia da Assembléia; FUND. GETULIO VARGAS.
Guia; Grande encic. Delta; Grande encic. portuguesa; INST. NAC. LIVRO. Índice;
LEITE, A. História; LEITE, A. Páginas; MELO, L. Subsídios; MIN. MAR. Almanaque;
MORAIS, A. Minas; NOGUEIRA FILHO, P. Ideais; PEIXOTO, A. Getúlio; SANTOS, J.
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Memórias; VELHO SOBRINHO, J. Dic.