SALES,
Válter Moreira
*superint. Sumoc 1951-1952; emb. Bras. EUA
1952-1953 e 1959-1960; min. Faz. 1961-1962.
Válter Moreira Sales nasceu em Pouso Alegre (MG) no dia 28 de maio de 1912, filho de João Moreira Sales e de Lucrécia
Vilhena de Alcântara Moreira Sales.
Morou na casa de seus avós maternos, coronel Saturnino
Vilhena de Alcântara e dona Georgina Duarte Vilhena de Alcântara em sua cidade
natal, até 1920, quando foi viver com seus pais e seus irmãos em Poços de
Caldas (MG). Fez o curso primário na cidade de Poços de Caldas na escola de
dona Rita Amarante, tendo começado o curso secundário em 1924, no recém-fundado
Liceu Franco-Brasileiro, na capital paulista. Em 1932 ingressou na Faculdade de
Direito do Largo de São Francisco, também em São Paulo.
Ao
atingir a maioridade tornou-se sócio da Moreira Sales & Cia., assumindo o
cargo de gerente da seção bancária, o que o obrigava a viajar três vezes por
semana para Poços de Caldas. A casa bancária, fundada em 1924, estava voltada
para operações de financiamento da produção local de café, muitas vezes através
de convênios com o Banco Francês e Italiano, o Banco Alemão Transatlântico e
outras instituições estrangeiras sediadas em São Paulo. Os negócios de seu pai se estendiam também à comercialização do café através do
porto de Santos (SP), cuja Associação Comercial chegou a presidir, e à produção
propriamente dita em grandes fazendas situadas em Espírito Santo do Pinhal, hoje Pinhal (SP), e no estado do Paraná, onde uma subdivisão de sua
propriedade deu origem ao município denominado Moreira Sales.
Válter concluiu o curso de direito em 1936 e quatro anos
depois assumiu o cargo de diretor do recém-fundado Banco Moreira Sales,
resultado da fusão da instituição financeira de seu pai com a Casa Bancária de
Botelhos e o Banco Machadense. A nova empresa cresceu rapidamente, contando com
sucursais nas cidades mineiras de Botelhos, Machado, Cabo Verde, Campestre,
Jirimirim (atual Poço Fundo) e Parreiras (atual Caldas), e expandindo seus
negócios a partir de 1941 para o Rio de Janeiro, então Distrito Federal, e São
Paulo. As instituições financeiras nacionais se beneficiaram muito da entrada
do Brasil na Segunda Guerra Mundial em 1942, pois receberam funcionários e
agências de bancos estrangeiros nacionalizados pelo governo. Assim, o Banco
Moreira Sales tornou-se nos anos seguintes uma empresa poderosa, com 26
sucursais espalhadas pelo Sul e Sudeste do país. Sua sede foi transferida para
o Rio de Janeiro em agosto de 1947, quando assumiu o controle do Banco Agrícola
Mercantil, fundado em 1904 no Rio Grande do Sul.
Em 1948, durante o governo do General Eurico Dutra, Moreira
Sales foi eleito para dirigir a Carteira de Crédito Geral do Banco do Brasil,
então presidido por Guilherme da Silveira. No início de 1951, pouco antes da
posse de Getúlio Vargas na presidência da República, financiou junto com
Ricardo Jafet (presidente do Banco do Brasil e diretor de um importante grupo
econômico de São Paulo) e Euvaldo Lodi (presidente da Confederação Nacional das
Indústrias) a compra do parque gráfico do Diário Carioca pelo jornalista
Samuel Wainer, interessado em criar a Última Hora para apoiar o futuro
governo. Esta operação seria objeto da formação de uma comissão parlamentar de
inquérito em 1953 para investigar denúncias veiculadas por Carlos Lacerda sobre
favorecimentos financeiros de instituições oficiais ao projeto de Wainer.
Com a posse de Getúlio Vargas em 31 de janeiro de 1951,
Horácio Lafer foi nomeado para ocupar o Ministério da Fazenda e convidou
Moreira Sales, com quem possuía negócios comuns, para ser o diretor executivo
da Superintendência da Moeda e do Crédito (Sumoc). No primeiro ano de sua
gestão, criou a Inspetoria de Bancos e o Departamento Econômico e participou da
reunião anual dos diretores do Fundo Monetário Internacional (FMI) e do Banco
Internacional de Reconstrução e Desenvolvimento (BIRD).
Sintonizado
com o esforço desenvolvido pelo ministro da Fazenda para tentar obter
financiamento internacional para projetos elaborados pela Comissão Mista
Brasil-Estados Unidos, Moreira Sales integrou a delegação brasileira que
participou em Washington da IV Conferência de Consulta dos Chanceleres
Americanos, convocada em 1951 por iniciativa dos Estados Unidos, que pretendiam
aumentar a participação latino-americana na defesa do hemisfério, assegurar o
fornecimento de materiais estratégicos para si, fomentar a transformação de
alguns setores industriais latino-americanos em linhas de produção necessárias
para fins militares e conseguir a participação de outros países do continente
na Guerra da Coréia. A delegação brasileira tentou tirar proveito dessas
exigências político-militares para obter um aumento na cooperação econômica
norte-americana com os projetos de desenvolvimento no Brasil, o que levou à
assinatura, em 1952, de um acordo bilateral regulamentando a troca de manganês,
areia monazítica e outros materiais estratégicos brasileiros por equipamentos
militares. Apesar da insistência norte-americana com relação ao envio de tropas
brasileiras para a Coréia e da posição favorável de João Neves da Fontoura,
ministro das Relações Exteriores, o governo de Vargas não concordou com essa
medida.
Embaixador nos Estados Unidos
Num
contexto em que aumentavam as pressões dos Estados Unidos por um alinhamento
mais efetivo do Brasil ao seu programa militar, Válter Moreira Sales deixou a
direção executiva da Sumoc e assumiu em junho de 1952 o posto de embaixador em
Washington, recebido das mãos do encarregado de negócios Afrânio de Melo Franco
Filho, que, desde o ano anterior, substituía o embaixador Maurício Nabuco.
Nesse
posto, Moreira Sales continuou atuando em sintonia com os objetivos de Horácio
Lafer, que pretendia obter dos norte-americanos 387,3 milhões de dólares para
financiar um conjunto de 41 projetos formulados pela Comissão Mista
Brasil-Estados Unidos. Entretanto, com a vitória do republicano Dwight
Eisenhower para a presidência dos Estados Unidos em fins de 1952 e a nomeação
de John Foster Dulles para o cargo de secretário de Estado, as relações
econômicas entre os dois países se tornaram mais difíceis. Apesar da
liberalização cambial adotada pelo Brasil em janeiro de 1953, o BIRD e o Export
Import Bank (Eximbank) relutavam em conceder mais financiamentos e, a partir de
julho, o governo de Washington deixou claro seu desejo de acabar com a Comissão
Mista Brasil-Estados Unidos.
Moreira
Sales deixou a embaixada em agosto de 1953, substituído por João Carlos Muniz,
retornando em seguida à condução dos seus negócios bancários. No período
seguinte, as relações entre o Brasil e os Estados Unidos se deterioraram em
conseqüência das políticas petrolífera, cambial e de preços em relação ao café
adotadas pelo governo Vargas, levando o BIRD e o Eximbank a suspenderem entre
1954 e 1958 os financiamentos ao país.
Em junho de 1959, o presidente Juscelino Kubitschek rompeu as
negociações entre o governo brasileiro e o FMI, considerando inaceitáveis as
exigências desta instituição para conceder o empréstimo solicitado. No mês
seguinte, nomeou Moreira Sales para substituir Ernâni Amaral Peixoto na
embaixada em Washington, pretendendo assim manter um bom relacionamento com os
Estados Unidos, que, desde a vitória da Revolução Cubana (1/1/1959),
mostravam-se mais sensíveis à reivindicação brasileira de adoção de um grande
plano de cooperação econômica com a América Latina. Moreira Sales permaneceu no
cargo até fevereiro de 1960, quando foi substituído por Carlos Alfredo
Bernardes, pouco antes da visita de Eisenhower ao Brasil e da retomada das
negociações com o FMI.
No
governo de Jânio Quadros, Moreira Sales voltou a ser convocado para atuar no
âmbito das relações econômicas entre o Brasil e os Estados Unidos. Junto com
Roberto Campos, Miguel Osório de Almeida e João Dantas, participou da missão
econômica encarregada de obter no exterior o financiamento necessário para
cobrir o déficit externo da economia brasileira. O trabalho da missão foi muito
facilitado pela reforma cambial decretada pelo governo através das instruções
nº 204, nº 205 e nº 208 da Sumoc, que fizeram o preço do dólar saltar de 90
para duzentos cruzeiros e eliminaram os subsídios cambiais, medidas
preconizadas pelo FMI. Em contrapartida, o Brasil conseguiu consolidar sua
dívida, prorrogar alguns pagamentos e obter novos empréstimos de 726 milhões de
dólares junto aos bancos norte-americanos e europeus.
No Ministério da Fazenda
A renúncia de Jânio Quadros em 25 de agosto de 1961
precipitou uma grave crise política, solucionada uma semana depois com a adoção
do regime parlamentarista, que viabilizou a posse do vice-presidente João
Goulart, considerado esquerdista por importantes grupos civis e militares
conservadores. Tancredo Neves foi nomeado primeiro-ministro e constituiu em 9 de
setembro um gabinete que incluía uma representação equilibrada dos grandes
partidos, nomeando Válter Moreira Sales para a pasta da Fazenda com o objetivo
de tranqüilizar os meios empresariais brasileiros e estrangeiros.
Além
da tensão política, o primeiro gabinete parlamentarista teve que enfrentar o
agravamento da crise econômica nacional, com a queda no ritmo de crescimento e
o aumento da taxa de inflação, dos déficits públicos e do desequilíbrio do
balanço de pagamentos. O FMI e os Estados Unidos exigiam a adoção de um
programa estabilizador baseado na redução dos gastos públicos, na contenção do
crédito e no maior controle sobre os aumentos salariais, mas estas medidas
encontravam sérias resistências internas na crescente mobilização trabalhista e
na presença, dentro do próprio governo, de forças políticas contrárias a essa
solução. Nesse contexto, Moreira Sales não conseguiu implantar nenhum programa
estabilizador, e o próprio gabinete não resistiu ao choque entre a crescente
mobilização popular em defesa das reformas de base e as pressões do grande
empresariado nacional e internacional a favor da política de austeridade.
Aproveitando a exigência legal de desincompatibilização para poderem concorrer
às eleições parlamentares de outubro de 1962, os ministros renunciaram
coletivamente em 26 de julho.
Goulart
voltou a enfrentar dificuldades para indicar o primeiro-ministro. Depois de
duas tentativas frustradas com o deputado petebista Francisco Clementino de San
Tiago Dantas e o senador pessedista Auro de Moura Andrade, conseguiu
finalmente, em 10 de julho, a aprovação do Congresso para a nomeação de
Francisco Brochado da Rocha, também do PSD. Moreira Sales foi mantido como
ministro da Fazenda do novo gabinete, empossado em 13 de julho. As contradições
internas do governo e a curta duração dessa equipe ministerial impediram mais
uma vez a implantação de um programa econômico-financeiro coerente. No terreno
político, a principal questão enfrentada pelo gabinete foi a antecipação do
plebiscito previsto na emenda constitucional de 1961 para decidir sobre a
manutenção do parlamentarismo ou a volta ao presidencialismo. Goulart pretendia
que essa consulta fosse realizada em outubro de 1962, sendo apoiado pelo
primeiro-ministro, por militares da chamada “ala nacionalista” e pelo movimento
sindical. Entretanto, essa proposta foi derrotada no Congresso em 14 de
setembro, provocando a renúncia do gabinete e a convocação de uma greve geral
pelo Comando Geral dos Trabalhadores (CGT). Nesse contexto, o Congresso cedeu
às pressões, marcando para 6 de janeiro de 1963 a realização do plebiscito e concedendo a Goulart poderes para nomear um gabinete interino que
atuaria até essa data. Hermes Lima foi então indicado para primeiro-ministro e
Miguel Calmon assumiu a pasta da Fazenda. No período seguinte, a crise política
se agravou, levando setores civis e militares oposicionistas a prepararem a
derrubada do governo pela força. Segundo René Dreyfuss, o Banco Moreira Sales
contribuiu financeiramente com o Instituto de Pesquisas Sociais (IPÊS), criado
para apoiar a conspiração que resultou no movimento político-militar de 31 de
março de 1964, que depôs o presidente Goulart
A
partir de 1964, Válter Moreira Sales passou a se dedicar exclusivamente à
expansão de seu banco, que absorveu sucessivamente os bancos Agrícola e
Mercantil Predial, do Distrito Federal e de Juiz de Fora, passando a se
denominar, em 1967, União de Bancos Brasileiros, com 333 agências espalhadas
por sete estados do Centro-Sul. Com a morte de seu pai em 1968, assumiu o
comando da instituição que, em 1975, adotou o nome de Unibanco.
Em
1980, o Unibanco representava um vasto conglomerado que atuava como banco
comercial, banco de investimentos, financeira, empresa de crédito imobiliário,
seguradora, corretora de valores mobiliários, empresa de leasing, distribuidora
de títulos, administração de bens patrimoniais, editora, publicidade e gráfica,
planejamento e comércio, e transportes e serviços. Também pertenciam ao grupo a
Brasilpar — Comércio e Participações S.A., A Itaparica S.A. (empresa de
turismo), a Brasilinvest S.A., a Brazilian Assets, e a Brasilinter S.A.
(sociedades de investimento), o Club Mediterranée do Brasil (turismo), a Estrel
(estudos, representações e administração), a Alexander Proudfoot Serviços, a
Fundação João Moreira Sales, a Bib Participações, a Unitrade S.A. (exportação e
importação) e a Credicard S.A. (administradora de cartões de crédito).
O grupo Unibanco possuía ainda 51% do capital da Companhia
Brasileira de Metalurgia e Mineração (CBMM), ficando os 49% restantes divididos
entre a Molycorp, norte-americana, e a Pato Gold Dregung. Além disso,
desenvolvia atividades comerciais e de investimentos associadas com bancos
alemães, suíços, norte-americanos e franceses.
Moreira
Sales vendeu sua parte da fazenda Bodoqueira, em Mato Grosso do Sul, cujo controle acionário dividia com David Rockefeller (presidente do
Chase Manhattan Bank) e Robert Anderson (proprietário da Atlantic,
distribuidora de derivados de petróleo). Em seguida, adquiriu o controle da
Brazil Warrant Agency and Finance Corporation, com sede em Londres, bem como o
de sua associada E. Johnston S.A., ambas dedicadas ao comércio internacional do
café e do algodão e proprietárias da Combuy Coffee and Company Plantation, uma
das maiores fazendas de café do mundo.
Em 1980, Moreira Sales expressou seu apoio à política
econômica do governo federal, orientada para a redução do déficit orçamentário,
o controle da moeda e a contenção dos subsídios governamentais.
Em 1991 deixou a presidência do conselho de administração do
Unibanco, sendo sucedido por Roberto Konder Bornhausen. A partir de então,
tornou-se presidente de honra do conselho de administração do Unibanco.
Na
década de 1990, centrou suas atenções no Instituto Moreira Sales, entidade
civil sem fins lucrativos criada em 1990 e mantida pelo Unibanco. O instituto
tornou-se responsável por quatro centros culturais — instalados em Poços de
Caldas (MG) (1992), São Paulo (1996), Belo Horizonte (1997) e Rio de Janeiro
(1999) — e pela coordenação das atividades do Espaço Unibanco de Cinema, rede
de cinemas de arte localizados no Rio de Janeiro, São Paulo, Belo Horizonte,
Fortaleza e Porto Alegre. Moreira Sales tornou-se, em 1991, presidente da
diretoria e do conselho consultivo do Instituto Moreira Sales. Tornou-se também
presidente da Casa de Cultura de Poços de Caldas.
Faleceu em Petrópolis no dia 26 de fevereiro de 2001.
Foi casado com Hélène Blanche Tourtois Moreira Sales, com
quem teve um filho. Casou-se pela segunda vez com Elisa Margarida Gonçalves
Moreira Sales, com quem teve mais três filhos, e pela terceira vez com Lúcia
Regina Moreira Sales.
Jorge
Miguel Mayer
FONTES: ARAÚJO, M. Segundo;
Balanço Financeiro (8/80); BANDEIRA, L. Presença; DELFIM NETO, A. Resposta;
DREIFUSS, R. Conquista; DULLES, J. Getúlio; ENTREV.
BIOGR.; FED. ESC. ISOLADAS DO EST. RJ. Ministros; FONTENLA, V. História;
HIRST, M. Ação; INF. BIOG.; Inst.
Moreira Sales. Catálogo (1999); MIN. FAZ. Ministros;
MIN. REL. EXT. Anuário (1955 e 1960-1961); SILVA, H. História (1961);
SKIDMORE, T. Getúlio; VÍTOR, M. Cinco.