MOVIMENTO
DA PANELA VAZIA
Movimento político de oposição aos governos federal e
paulista surgido em 1954 em São Paulo sob a liderança dos comunistas durante a
campanha para as eleições parlamentares e para o governo do estado, marcadas
para o dia 3 de outubro daquele ano.
Com o mesmo nome existiu em 1945, igualmente em São Paulo, um
movimento favorável a Getúlio Vargas, considerado antecessor do Movimento
Queremista.
Formação e programa
O
Movimento da Panela Vazia teve origem em março de 1953, quando se
intensificaram os protestos contra os constantes aumentos do custo de vida.
Nessa ocasião, segundo Abguar Bastos, “dezenas de milhares de donas-de-casa”,
erguendo panelas vazias, desfilaram pelas ruas da capital paulista rumo ao
palácio do governo. Sua intenção era manifestar oposição ao governador Lucas
Garcez e ao presidente Getúlio Vargas, considerados como os maiores
responsáveis pela “subida vertiginosa do custo de vida” e acusados de
“traidores do povo”.
No decorrer de 1954, em função das eleições de outubro, o
Movimento da Panela Vazia se organizou, liderado pelos comunistas. Sua
preocupação básica era apresentar um candidato de oposição ao governo do
estado.
Num
comício realizado no início de agosto desse ano, foram finalmente lançados os
candidatos do movimento, sob a legenda da Coligação Eleitoral pelo Progresso de
São Paulo. Eram eles o general Leônidas Cardoso, Armando Zemella, Leonardo
Lombardo, Ramiro Lucchesi, Osvaldo Joaquim Ortiz Monteiro, Ralph Zumbano, João
Sanches Segura, Pascoalino Stuani, Elisa Branco, Calil Chade, Armando Mazzo,
Rosária Amado, Araújo Plácido e Pedro Iovine. Seu objetivo era “lutar contra a
carestia, pelo congelamento dos preços, contra o racionamento de energia
elétrica, pela proteção à indústria e à agricultura, e pela expulsão das
empresas imperialistas norte-americanas”.
Ainda nesse comício, foi divulgado o manifesto da Coligação
Eleitoral, acusando Vargas e Garcez de “entregar o país aos imperialistas
norte-americanos e de explorar as massas”. O programa da coligação era extenso,
abrangendo itens como a “defesa da economia do Estado” e a “defesa das
reivindicações populares”.
No primeiro item incluíam-se a abolição de todos os impostos
“extorsivos” que pesavam sobre o comércio e a indústria, a garantia de crédito
para os pequenos e médios industriais, comerciantes, agricultores e
pecuaristas, a proteção ao parque industrial com a suspensão do racionamento de
energia elétrica, através da encampação das companhias Bond and Share e Light,
a ampliação do mercado externo e a extinção do monopólio do café, do algodão e
de outros produtos, exercido por empresas norte-americanas “como a Sanbra e a
Anderson Clayton”.
O segundo item compreendia a aplicação do salário mínimo sem
a exigência de assiduidade, o aumento geral dos salários, o congelamento de
preços, a extensão da legislação trabalhista ao campo, a construção de
estradas, a garantia de preços mínimos compensadores e de transporte rápido
para os produtores de cereais, o auxílio ao cooperativismo, a instalação de
hospitais, maternidades e centros de puericultura, a ampliação da rede de água
e esgotos e o combate ao analfabetismo, com a criação de novas escolas e a
distribuição gratuita de material escolar.
Além desses dois grandes itens, o programa da coligação
incluía a defesa “intransigente” das liberdades democráticas e sindicais e do
direito de voto para os analfabetos, soldados e marinheiros. Sob o item “defesa
e paz”, finalmente, a coligação propunha que fossem denunciados o Acordo
Militar Brasil-Estados Unidos e todos os outros tratados “lesivos à soberania e
à livre determinação dos povos”, e que fossem proibidas as armas atômicas.
Atuação
No dia 19 de agosto de 1954, ao mesmo tempo em que articulavam
uma greve geral pelo congelamento de preços, os líderes do Movimento da Panela
Vazia organizaram uma convenção na qual o general Leônidas Cardoso foi indicado
para concorrer ao governo de São Paulo. Foi também apresentada a lista oficial
dos candidatos à Câmara Federal e à Assembléia estadual.
Poucos dias depois, em 24 de agosto, o suicídio de Getúlio
Vargas forçou a oposição em todo o país a se reposicionar em face das eleições
de 3 de outubro. Assim, em meados de setembro, deixando de lado a legenda Coligação
Eleitoral pelo Progresso de São Paulo, os candidatos “panela vazia” deram
entrada em seu pedido de registro junto ao Tribunal Regional Eleitoral (TRE)
sob a legenda do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), fundado e liderado por
Vargas desde 1945. O TRE, no entanto, negou o registro a cinco postulantes:
Jorge Amado, que pretendia concorrer ao cargo de deputado federal, e mais
Antônio Chamorro, Ênio Sandoval Peixoto, Rosária Amado e Carlos Ortiz, estes
pretendentes à Assembléia estadual.
No final de setembro, quando trabalhistas e comunistas já
marchavam juntos na campanha eleitoral, a candidatura do general Leônidas
Cardoso ao governo de São Paulo foi substituída pela de Vladimir de Toledo
Piza.
Os candidatos “panela vazia” declararam-se nesse momento
contra o golpe que derrubara Vargas do poder e contra o “governo entreguista de
Café [Café Filho], Brigadeiro [Eduardo Gomes] e Cia., governo de carestia e
esfomeamento do povo”.
As eleições se realizaram, como fora programado, no dia 3 de
outubro. Dos candidatos do Movimento da Panela Vazia foram eleitos apenas
Abguar Bastos e Leônidas Cardoso para a Câmara Federal, na legenda do PTB, e,
para a Assembléia estadual, José Rocha Mendes, do Partido Trabalhista Nacional
(PTN), Ralph Zumbano, do PTB, e Ariel Tomasini, do Partido Republicano
Trabalhista (PRT).
No entanto, a maior derrota eleitoral sofrida tanto pelo PTB
como pelos comunistas foi em relação ao governo de São Paulo: Vladimir de
Toledo Piza foi o quarto e último colocado. Até mesmo Ademar de Barros, chefe
do Partido Social Progressista (PSP), foi derrotado no pleito por Jânio
Quadros, eleito por uma coligação formada pelo PTN e o Partido Socialista
Brasileiro (PSB).
Vera Calicchio
FONTES: CHILCOTE,
R. Brazilian; Notícias de Hoje (1954); SKIDMORE, T. Brasil.